BALAIO PORRETA 1986
n° 2245
Rio, 27 de fevereiro de 2008
n° 2245
Rio, 27 de fevereiro de 2008
GODBYE
Tião Martins
[ in Poesia & Cia ]
Deus disse adeus
e nem quer saber
por que a humanidade
não melhora
saiu para almoçar
e não voltou
até agora.
Repeteco
PEQUENAS LEMBRANÇAS DO PAISSANDU
[ in Balaio, n° 1581, de 31/07/2005 ]
Para muitos cinéfilos da Geração Paissandu, do Rio, nos anos 60 do século passado, Godard era mais do que um símbolo da transgressão cinematográfica e da rebeldia juvenil. Era uma verdadeira religião. Em certa oportunidade, encontrava-me tranqüilamente numa daquelas filas quilométricas para ver mais um filme de sua autoria, à meia-noite de um sábado qualquer, talvez chuvoso, talvez nebuloso, quando um rapaz com ares de filósofo aproximou-se e começou a distribuir a seguinte mensagem, ou algo similar: "Salve Godard, meu Senhor Todo-Poderoso, criador do cinema moderno, abençoado sois entre todos os diretores, perdoai aqueles que não vos admiram, agora e na hora da exibição de seus filmes, para que possamos lutar contra a ditadura com mais energia e mais convicção, amém!". Lembro-me também de uma bela e jovem mulher - completamente careca - que ficava minutos intermináveis sem dizer uma palavra sequer, à espera não só do último Godard, mas também do último Resnais, do último Buñuel, do último Bresson, do último Bergman, do último Polanski, do último Kubrick (que seria apresentado no Roxy), do último Antonioni (que seria exibido no Metro Copacabana). E quem, entre os cinqüentões/sessentões de hoje, em lá estando, não se recorda da noite em que Glauber Rocha, em frente ao Oklahoma (ao lado do Paissandu), mais godardiano do que nunca, bradou provocadoramente: "O mais recente Losey é melhor do que Pierrot le fou" (então em cartaz). Eu mesmo, ora nas mesas bêbadas do Cinerama [hoje, Garota do Flamengo], ora nas mesas etílicas do Oklahoma, depois de longos papos sobre o poema/processo e as obras de Althusser, Mao, Foucault, Badiou e Macheray, discutia com os amigos, sempre calorosamente, se Antonioni, Welles e Godard não formavam a Santíssima Trindade do Cinema, três autores que se completavam numa só e mesma pessoa, mesmo considerando que Welles detestava Antonioni, assim como detestava Bergman e Bresson. Mesmo considerando que os três tinham propostas estéticas bastante diferentes e que havia uma ditadura a nos reprimir, a nos silenciar, a nos acossar. De qualquer modo, muita gente resolveu pegar em armas (reais ou imaginárias) depois que viu A chinesa, Week-end e One plus one, e de ter lido os textos de Mao, Guevara e Trotsky. E de repente, mais de 35 anos depois, uma pergunta surge de maneira inesperada: o que será feito daquela bela morena que, mais revolucionária do que todos nós, amava Baudelaire, gatos, auroras e Godard?
Tião Martins
[ in Poesia & Cia ]
Deus disse adeus
e nem quer saber
por que a humanidade
não melhora
saiu para almoçar
e não voltou
até agora.
Repeteco
PEQUENAS LEMBRANÇAS DO PAISSANDU
[ in Balaio, n° 1581, de 31/07/2005 ]
Para muitos cinéfilos da Geração Paissandu, do Rio, nos anos 60 do século passado, Godard era mais do que um símbolo da transgressão cinematográfica e da rebeldia juvenil. Era uma verdadeira religião. Em certa oportunidade, encontrava-me tranqüilamente numa daquelas filas quilométricas para ver mais um filme de sua autoria, à meia-noite de um sábado qualquer, talvez chuvoso, talvez nebuloso, quando um rapaz com ares de filósofo aproximou-se e começou a distribuir a seguinte mensagem, ou algo similar: "Salve Godard, meu Senhor Todo-Poderoso, criador do cinema moderno, abençoado sois entre todos os diretores, perdoai aqueles que não vos admiram, agora e na hora da exibição de seus filmes, para que possamos lutar contra a ditadura com mais energia e mais convicção, amém!". Lembro-me também de uma bela e jovem mulher - completamente careca - que ficava minutos intermináveis sem dizer uma palavra sequer, à espera não só do último Godard, mas também do último Resnais, do último Buñuel, do último Bresson, do último Bergman, do último Polanski, do último Kubrick (que seria apresentado no Roxy), do último Antonioni (que seria exibido no Metro Copacabana). E quem, entre os cinqüentões/sessentões de hoje, em lá estando, não se recorda da noite em que Glauber Rocha, em frente ao Oklahoma (ao lado do Paissandu), mais godardiano do que nunca, bradou provocadoramente: "O mais recente Losey é melhor do que Pierrot le fou" (então em cartaz). Eu mesmo, ora nas mesas bêbadas do Cinerama [hoje, Garota do Flamengo], ora nas mesas etílicas do Oklahoma, depois de longos papos sobre o poema/processo e as obras de Althusser, Mao, Foucault, Badiou e Macheray, discutia com os amigos, sempre calorosamente, se Antonioni, Welles e Godard não formavam a Santíssima Trindade do Cinema, três autores que se completavam numa só e mesma pessoa, mesmo considerando que Welles detestava Antonioni, assim como detestava Bergman e Bresson. Mesmo considerando que os três tinham propostas estéticas bastante diferentes e que havia uma ditadura a nos reprimir, a nos silenciar, a nos acossar. De qualquer modo, muita gente resolveu pegar em armas (reais ou imaginárias) depois que viu A chinesa, Week-end e One plus one, e de ter lido os textos de Mao, Guevara e Trotsky. E de repente, mais de 35 anos depois, uma pergunta surge de maneira inesperada: o que será feito daquela bela morena que, mais revolucionária do que todos nós, amava Baudelaire, gatos, auroras e Godard?
5 comentários:
Provavelmente casou,teve filhos e vive no shopping aproveitando a vida,heheheh. Como qualquer pessoa normal deste século.
Abraços!!
Belo, Moacy.
Belo tempo aquele em que se discutia livros, filmes e músicas nas mesas dos bares. Sorte nossa que estavámos lá, participando de tudo, não importa se como coadjuvantes. Millôr estava certo, quando escreveu, em pleno anos de chumbo: "ainda vai chegar o dia em que, lembrando esta época, vamos dizer: Bons tempos, hein?"
Um abraço.
Poxa Moacy, bela surpresa mesmo! Obrigado pela divulgação do trabalho.
Conheci sim sua ex-mulher, Analéa, naqueles tempos saudosos de IACS. Aliás, sou casado com uma colega da época, a jornalista Matilde Silveira.
Sei que vc já não está mais na UFF. Ainda mora no Rio?
Abraço!
Deliciosas lembranças!
belissima foto do Paissandu...
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