Amantes
ou
O amor na Idade de Ouro
(1585-89)
Paolo Fiammingo
BALAIO PORRETA 1986
n° 2654
Rio, 7 de maio de 2009
Em algum momento no final do segundo milênio antes de Cristo, a vanguarda espiritual do povo hebreu começou a imaginar a criação e o criador, a história e a humanidade, de um modo radicalmente novo. Esse radicalismo de visão, embora jamais chegasse à unanimidade, gerou certos padrões subjacentes de expressão literária nos séculos que se seguiram. ... Essa fascinante e interminável antologia da antiga literatura hebraica estava também, contra todas as acepções plausíveis da palavra, no caminho de tornar-se um livro.
(Robert ALTER, in Guia literário da Bíblia, 1987)
O LIVRO DOS LIVROS
(26)
Texto revisado por
Eme Costa, o Ateu
A terra prometida
E os seridoenses de outras paragens e outras viagens queriam saber de Moysés Sesyom do Sertão, seu profeta e patriarca, como seria verdadeiramente o Seridó. Ansiavam por uma nova partida - dessa vez em direção ao sul, em direção à terra prometida -, mesmo que ainda demorassem um pouco em Açu. É verdade, é verdade: vários deles já estavam se desgarrando do rebanho original, alguns à procura de Mossoró, Macau, Areia Branca, Galinhos e Fortaleza; outros, à procura de Caiçara do Rio dos Ventos, Macaíba, Parnamirim, Cidade dos Reys e Campina Grande.
E os seridoenses exigiram a presença de Moysés Sesyom do Sertão no mercado principal da cidade. E Moysés Sesyom do Sertão apareceu no mercado de Açu. E Moysés Sesyom do Sertão pegou de sua viola - que ganhara do seu xará Moisés Sesiom do Seridó - e cantarolou para os retirantes de mais uma seca inclemente e também para a gente assuense:
ou
O amor na Idade de Ouro
(1585-89)
Paolo Fiammingo
BALAIO PORRETA 1986
n° 2654
Rio, 7 de maio de 2009
Em algum momento no final do segundo milênio antes de Cristo, a vanguarda espiritual do povo hebreu começou a imaginar a criação e o criador, a história e a humanidade, de um modo radicalmente novo. Esse radicalismo de visão, embora jamais chegasse à unanimidade, gerou certos padrões subjacentes de expressão literária nos séculos que se seguiram. ... Essa fascinante e interminável antologia da antiga literatura hebraica estava também, contra todas as acepções plausíveis da palavra, no caminho de tornar-se um livro.
(Robert ALTER, in Guia literário da Bíblia, 1987)
O LIVRO DOS LIVROS
(26)
Texto revisado por
Eme Costa, o Ateu
A terra prometida
E os seridoenses de outras paragens e outras viagens queriam saber de Moysés Sesyom do Sertão, seu profeta e patriarca, como seria verdadeiramente o Seridó. Ansiavam por uma nova partida - dessa vez em direção ao sul, em direção à terra prometida -, mesmo que ainda demorassem um pouco em Açu. É verdade, é verdade: vários deles já estavam se desgarrando do rebanho original, alguns à procura de Mossoró, Macau, Areia Branca, Galinhos e Fortaleza; outros, à procura de Caiçara do Rio dos Ventos, Macaíba, Parnamirim, Cidade dos Reys e Campina Grande.
E os seridoenses exigiram a presença de Moysés Sesyom do Sertão no mercado principal da cidade. E Moysés Sesyom do Sertão apareceu no mercado de Açu. E Moysés Sesyom do Sertão pegou de sua viola - que ganhara do seu xará Moisés Sesiom do Seridó - e cantarolou para os retirantes de mais uma seca inclemente e também para a gente assuense:
"No Seridó tem
No Seridó tem
Tem oiticica, algodão e vacaria(¹)
Aurora, crepúsculo e sangria(²)
No Seridó tem
No Seridó tem
Mulher nova, formosa e apetitosa(³)
Terra da boa, carnuda e cheirosa
No Seridó tem
No Seridó tem
Tem cabra da peste, cabra da porra, cabra trabalhador
Tem cabra bom de copo, bom de cama, e galanteador
No Seridó tem
No Seridó tem
Serra, serrote e serrania
Manga, pinha e comedoria(ª¹)
No Seridó tem
No Seridó tem
Tem forró, vaquejada e carnaval
Queijo de coalho, rapadura e milharal
No Seridó tem
No Seridó é assim
Lá em se plantando tudo se dá(ª²)
Lá em se querendo tudo se tem".
Notas:
(1) Séculos depois, prosperariam na região seridoense as culturas do algodão, do couro e do boi misterioso.
(²) Sangria : Do verbo "sangrar" - o transbordamento das águas de um açude, seja pelos sangradouros laterais das paredes de barro e pedregulhos que as represam, seja por cima da próprias paredes de concreto.
(³) O Livro omite o fato, mas se sabe - através da tradição oral - que as mulheres do grupo, em grande número, protestaram com veemência contra essa previsão machista. Algumas delas, inclusive, teriam iniciado, naquele momento, a primeira "greve de sexo" da história da humanidade.
(ª¹) Há outra versão desses versos, segundo a tradução de Eliene Dantas de São José dos Santos: "No Seridó tem/ No Seridó tem/ Serra, serrote e muito sol/ Manga, pinha e carne de sol". Para os sulistas da terra brasilis: "pinha" é "fruta do conde", ou apenas "conde".
(ª²) Possível inspiração, muito tempo depois, para o escrivão Pero Vaz de Caminha, da frota cabralina. Neste caso, seria mais uma prova documental a ser sustentada pelo historiador e teólogo Lenine Pinto, da Cidade dos Reys, para quem o Monte Pascoal na verdade é o Pico do Sabugy, nas proximidades de Angicos, praticamente ao lado de Açu. Os portugueses, assim, teriam desembarcado na costa do Ryo Grande, no ano da graça de 1500 da Era Comum, tomando em seguida a direção do Seridó.
(ª³) Houve exceções, contudo: vide nota ³.
(ªª¹) Forrobodó : Forró, forró de raiz, forró autêntico.
(ªª²) Relabucho : Forró, forró de raiz, forró autêntico.
(ªª³) Arrasta-pé : Forró, forró de raiz, forró autêntico.
(ªªª¹) Coisa danisca de boa : Coisa danada de boa, coisa boa demais.
No Seridó tem
Tem oiticica, algodão e vacaria(¹)
Aurora, crepúsculo e sangria(²)
No Seridó tem
No Seridó tem
Mulher nova, formosa e apetitosa(³)
Terra da boa, carnuda e cheirosa
No Seridó tem
No Seridó tem
Tem cabra da peste, cabra da porra, cabra trabalhador
Tem cabra bom de copo, bom de cama, e galanteador
No Seridó tem
No Seridó tem
Serra, serrote e serrania
Manga, pinha e comedoria(ª¹)
No Seridó tem
No Seridó tem
Tem forró, vaquejada e carnaval
Queijo de coalho, rapadura e milharal
No Seridó tem
No Seridó é assim
Lá em se plantando tudo se dá(ª²)
Lá em se querendo tudo se tem".
E os seridoenses de outras terras e outras guerras gostaram do que ouviram(ª³). E o Senhor das Alturas aprovou o que ouviu. E os seridoenses e os açuenses presentes ao ato foram dançar um forrobodó(ªª¹) arretado, relabucho(ªª²) dos melhores, ao som de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e Elino Julião, sob o comando porreta de Cristal de Gramoré e Carito Ivo Ivo, que vieram da capital exclusivamente para animar a festa. Até mesmo Moysés Sesyom do Sertão, apesar da idade, entrou no arrasta-pé(ªª³). Eita, que coisa danisca de boa!(ªªª¹)
Próximos capítulos:
Despedida e morte de Moysés Sesyom do Sertão
O funeral de Moysés Sesyom do Sertão
Próximos capítulos:
Despedida e morte de Moysés Sesyom do Sertão
O funeral de Moysés Sesyom do Sertão
Notas:
(1) Séculos depois, prosperariam na região seridoense as culturas do algodão, do couro e do boi misterioso.
(²) Sangria : Do verbo "sangrar" - o transbordamento das águas de um açude, seja pelos sangradouros laterais das paredes de barro e pedregulhos que as represam, seja por cima da próprias paredes de concreto.
(³) O Livro omite o fato, mas se sabe - através da tradição oral - que as mulheres do grupo, em grande número, protestaram com veemência contra essa previsão machista. Algumas delas, inclusive, teriam iniciado, naquele momento, a primeira "greve de sexo" da história da humanidade.
(ª¹) Há outra versão desses versos, segundo a tradução de Eliene Dantas de São José dos Santos: "No Seridó tem/ No Seridó tem/ Serra, serrote e muito sol/ Manga, pinha e carne de sol". Para os sulistas da terra brasilis: "pinha" é "fruta do conde", ou apenas "conde".
(ª²) Possível inspiração, muito tempo depois, para o escrivão Pero Vaz de Caminha, da frota cabralina. Neste caso, seria mais uma prova documental a ser sustentada pelo historiador e teólogo Lenine Pinto, da Cidade dos Reys, para quem o Monte Pascoal na verdade é o Pico do Sabugy, nas proximidades de Angicos, praticamente ao lado de Açu. Os portugueses, assim, teriam desembarcado na costa do Ryo Grande, no ano da graça de 1500 da Era Comum, tomando em seguida a direção do Seridó.
(ª³) Houve exceções, contudo: vide nota ³.
(ªª¹) Forrobodó : Forró, forró de raiz, forró autêntico.
(ªª²) Relabucho : Forró, forró de raiz, forró autêntico.
(ªª³) Arrasta-pé : Forró, forró de raiz, forró autêntico.
(ªªª¹) Coisa danisca de boa : Coisa danada de boa, coisa boa demais.
7 comentários:
Bom Dia, Moacy!
Como sempre o esmero na gravura de Paolo! Bravíssimo!
A revisão do LIVRO poe Eme Costa, O ATEU, está otima.
E assim vou aprendendo as terminologias de forró.
Muito Bom!
Parabéns, amigo
Beijos
Mirse
Será que Moysés Sesyom do Sertão previu as chuvas dos dias atuais?! Falando em chuva, linda moça perdida no Nordeste, perfil grego... E adorei o post anterior! Abração!
Será que Moysés Sesyom do Sertão previu as chuvas dos dias atuais?! Falando em chuva, linda moça perdida no Nordeste, perfil grego... E adorei o post anterior! Abração!
Mestre,
por enquanto vim agradecer o carinho e metade dos problemas foram resolvidos, falta um tantinho, mas sei que vou dar conta. Aprendi que não se deve deixar derrubar por nada, tem que se levantar a cabeça e seguir em frente. E carinho, é sempre carinho, mesmo a distância!
Depois venho para ver essa tal terra prometida.
Obrigada e beijos carinhosos!
Parece reconto da bíblia.
coisa danisca de boa é ser borogodosa!!!
besos
já vai matar o cabra, Moa? deixa ele se divertir mais um cadin... rs
beijos
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