sábado, 26 de dezembro de 2009

Rio, crepusculando:
Ipanema, Leblon, Dois Irmãos
[ Foto: Marcus Moura ]

( Nota: em janeiro retomaremos
Um filme é um filme é um filme )


BALAIO PORRETA 1986
n° 2881
Rio, 26 de dezembro de 2009


Toda época deve reinventar
seu próprio projeto de "espiritualidade".
(Susan SONTAG. A vontade radical, 1966-69)


ESCAFANDRO
Dalila Teles Veras
[ in À janela dos dias. SP, 2002 ]

Que ligações cósmicas
são estas
a fundir-me assim
a fazer-me água?
: despreparada escafandrista

Que mar é este
a fazer-me peixe
a fazer-me alga?
: coral em bruto
à mercê do joalheiro


Fragmentos dos
CADERNOS
(1894-1945)
Paul Valéry
[ Trad. Augusto de Campos, 1984 ]

Meu fácil me enfada. Meu difícil me guia.

O que eu sei fazer me entedia;
o que eu não sei fazer me entristece.

O que é difícil é sempre novo.

A obra de arte me dá ideias,
ensinamentos, não prazer.

Quase todos os livros que eu estimo
e absolutamente todos os que me serviram
para qualquer coisa são difíceis de ler.

Nos livros, como nos pratos,
só gosto do que é magro.

... são as minhas imposibilidades
que me excitam.

Nada de repetições:
construir para se destruir.

Prefiro ser lido muitas vezes
por um só do que uma só vez
por muitos.

O que há de mais fecundo para
o pensamento que o imprevisto?


BECO DA LAMA
(em Natal)
Maria Maria
[ in Espartilho de Eme ]

O beco estreito
da velha cidade
guardou os deleites
dos grandes amantes.

O beco estreito
da velha cidade
guardou uma pedra
de diamantes.

O beco estreito
da velha cidade
guardou as memórias
dos navegantes.

O beco estreito
da velha cidade
beco da troca,
beco da trama.

O beco estreito
da velha cidade
foi beco da dama,
o Beco da Lama.


DOZE PERSPECTIVAS
Marcelo Novaes
[ in Prosas Poéticas ]

Possível não será mergulhar em mim. Ou traduzir-me. Se repudias o meu sonho, perdes aquela minha maior parte: a ponte entre a Vida e o corpo, agora inerte. Não tire ainda o tubo: cateter. Se possível, não ranja os dentes, para que ouças mais de mim sem teu próprio ruído. Se te assustas com a mistura de pronomes e verbos, ouça e ouças mais de mim, que nada custa. São necessárias doze perspectivas: intensa e cerebral, eis a primeira. Não as dissocie, pois que em mim o cérebro é que dança a dança primordial. Primordial dança? Procure-a no sol dos dias frios. Calma e não-tolhida, eis a segunda. Perspectiva da alma, que abandona o corpo sabendo bem feita a lida. Doce labuta, gentil proeza. As flores cabem todas nesse jarro; as penas, nesses olhos. E as horas se derramam sobre o solo. Não pense em mim através das simples cenas [balas de chumbo ou festim]: são heterônimos. Eis a terceira forma de encontrar-me: deixando as sombras de fora. A quarta é simplesmente aninhar-se, sonhando comigo em concha. Esqueça o barulho da serra tentando cortar a fina liga: nosso amor de est(r)anho(s). Sim: o silêncio é a quinta maneira de desvelar-me e alçar-me do branco. Pinte o semblante de meu contorno, sem idade. Junte tudo, desde trás até a morte. Assim, a sexta forma de conceber-me: nimbado em meigo amor-de-mármore. Sabendo de mim a metade, desista. E eis que enfim, a sétima forma de ver-me (sem-fôrma) se desvelará à vista. [Gentil donzela, prestes a cair da cadeira]. Do chão tudo se vê melhor: horizontal & oitava maneira. A nona se dá após fechar os olhos, em posição fetal. Para maior conforto, nunca por desilusão. [De forma lenta e branda voa melhor a branca nau]. E a vida das plantas e troncos, sem mim, não desanca. Esqueça, então, o lenço de despedida. Rasgue-o, despeça-o. Descanse-o ao chão. A décima forma de sondar-me se resume a deixar para trás o Adeus. Suportar o Claro Breu no Cósmico Vão, cada Eu-Todo em suas Partes [ou Nenhuma] é forma melhor de Encontrar-me: décima primeira. E que não ajas como dama ou mulher destronada. Lembra-te dos Apóstolos: eram Doze. Judas caiu. Matias em seu lugar foi posto. Tudo se move, do Sem-Fim ao Princípio : até a lágrima em teu rosto.


Lembranças afetivas
Em um bar em Natal, na noite de 23/12/09
Em pé: o primo Joamir Medeiros
Sentados, da esquerda para a direita:
Medeirinho (irmão de Joamir), este vosso blogueiro
e o irmão Milton Cirne

9 comentários:

Unknown disse...

Não tem pra nenhum lugar do mundo!

O Rio é bonito em qualquer ângulo, época ou efeitos meteorológicos.
Lindo por do sol!

Oi Moacy!

Marcelo Novaes, ensina e bem. Tudo o que faz é perfeito!

Maria Maria, uma beleza de pessoa que por acaso é poeta.

Os dois irmãos Cirne: jovens no olhar que cobrem distâncias !

Bela fotografia!

Beijos

Mirse

NAMIBIANO FERREIRA disse...

Prazer em conhecer o rosto de quem faz o Balaio com arte e qualidade. Um prazer vir aqui.
Kandandu e continuacao de Boas Festas

Pedrita disse...

adorei a foto do grupo. beijos, pedrita

Unknown disse...

Um balaio com Valéry e outras preciosidades. O último sábado de 09. Vamos degustar.

Marcelo Novaes disse...

Moa,



Não me deterei em Paul Valéry. Não se tornou referência "por acaso". Maria Maria mostra, simplesmente, "o mundo que cabe no beco".


Esse grupo reunido é só simpatia.



"Salve simpatia", como diz nosso irmão da música. Ben. Ou Benjor.





Abração,










Marcelo.

nina rizzi disse...

Valery é ótimo, assim cmo as doze perspectivas de Novaes, mas olha... que grupo animado e lindo! Moacy, tu é cara do mano!

Um beijo pra esse rio, lindo!

líria porto disse...

vou ser direta - te acho lindo - e é por tudo, visse - viva o balaio!

Maria Maria disse...

Oi, poeta Moacy!

Obrigada pela postagem do Beco da Lama.

Tenha um 2010 rico de poesia!
Beijos

BAR DO BARDO disse...

"Buemba"!!!