terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

RASGADA NO CAPIBARIBE
por Sandra CAMURÇA
[ in O Refúgio ]
O rio freveu a noiteira e vi ouvi borbulhas doiradas dos metais sonoros - timbres frevendo em jazzeanas canções. Da ponte saltei e mergulhei fundo no fundo das águas do rio que corre na cidade estuário onde deságua nobreza de ritmos, tons, batuques e metais penetrando meus orifícios possíveis impossíveis...Voltei à tona feliz e desnuda de preconceitos: rasgaram-me as vestes de pudores musicais.


BALAIO PORRETA 1986
nº 1961
Natal, 27 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos


PAGAR O QUÊ?
por Hugo MACEDO
[ in Beco Estreito. Natal, 2006, p.29 ]

Mané Bonitim [de Parelhas, RN] estava "doido" pra tomar uma de cana na festa de Acari [cidade vizinha, em pleno Seridó]. Mas, como não tinha um tostão no bolso, não contou conversa: com sua astúcia, chegou no bar central da cidade, e pediu ao balconista:

- Bota aí um café, cabra!

O inocente homem atendeu de prontidão, mas, antes mesmo do primeiro gole, Bonitim falou:

- Amigo, você poderia trocar o café por uma chamada de cana? Parece que a festa tá boa, né?

- É, posso. Disse o acariense.

Aproveitando a distração do atendente, Mané Bonitim engoliu a cachaça de uma só vez e foi saindo de fininho sem pagar, quando o dono do bar o abordou já na calçada:

- Ei! Pague a cachaça, rapaz!

- Que cachaça? Eu não troquei pelo café?

- Então, pague o café!

- E eu bebi café?

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

ELEGIA DA RIBEIRA - Fragmento inicial da crônica publicada na Tribuna do Norte, de Natal, em 29 de maio de 2005, por SANDERSON NEGREIROS ( Poeta e escritor ): Se as Quintas são profundas, o Alecrim festivo, o Tirol dionisíaco, as Rocas misteriosas, Petrópolis principesco, a velha Ribeira se torna cada vez mais solitária. Sumindo, equilibra-se no espaço com seu empobrecimento diário, ao definhar em velhice surda e muda; com sua fome boêmia, sua sede de beleza perdida; e desfile de centenas de personagens que, impossibilitados de aceitarem a cidade diurna e moderna, refugiam-se no silêncio pesado que o bairro sustém e sustenta. Tornam-se, porque são, seres invisíveis.



BALAIO PORRETA 1986
nº 1960
Natal, 26 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos


Repeteco
A ESTRADA
Moacy Cirne

Sinto o primeiro impacto. De imediato, sou dominado por inesperada quentura nas costas. Mas consigo correr. E corro. Um segundo impacto me atinge. Preciso correr, mais ainda. Um rio me aguarda, à esquerda. Mergulho nele. Suas águas me envolvem com certa doçura. Mas de onde surgira aquele rio, em plena Glória, entre a Lapa e o Catete? Não importa; o que importa é que estou a salvo. O calor aumenta. Ouço os sinos da igreja mais próxima. Uma voz de rapariga me chama. Ambrósio, Ambrósio, cuidado com a ponte, não se deixe enforcar. O fogo me queima por dentro. Não sei nadar, lembro-me de repente. O que está acontecendo, então? Só sei que não existe mais qualquer sinal de rio; estou numa estrada de tijolos amarelos, familiar cena de filme antigo. Caminho com passos lentos; o calor que me domina é intenso. Pressinto que minhas roupas estão encarnadas. E encarnado é o meu cordão, em disputa contra o cordão azul. Sou uma criança apaixonada pela rainha do Encarnado na cidade da minha infância. Carlitos, o Gordo e o Magro me fazem companhia, sorrindo. Durango Kid aproxima-se: Não se preocupe, estou aqui para defendê-lo dos bandidos. Estou aqui para salvá-lo das balas perdidas. Confie em mim. Olho para o meu avô, com sua ternura sem fim. No caminhão da feira, cortando o cheiro da manhã carregada de mangas e esperanças, contamos os jumentos à beira da estrada, a mesma estrada de tijolos amarelos. À esquerda e à direita vemos jumentos tristes e honestos. São dezenas, são centenas deles. Estranho, parecem pássaros que não sabem voar. Quem ganhará a aposta? O feirante bêbado de auroras garantindo que à direita do veículo, beirando a estrada, maior seria o número daqueles pobres e inevitáveis animais? Ou vencerá o outro? O outro não sou eu; eu sou aquele que precisa mergulhar no Poço de Santana, no final da estrada. Mas o Poço está longe, muito longe. Nunca fiz um filho. Nunca plantei uma árvore. Nunca escrevi um livro. Nunca entrei num túnel tão comprido. E as coisas estão ficando cada vez mais nebulosas. Além, já noite, do alto do coreto da praça, Luiz Gonzaga acena para mim. Asa branca, assum preto, légua tirana. Baião-de-dois. Baião-de-três. Baião-de-cinco. O império submarino. Flash Gordon no Planeta Mongo. A volta do Aranha-Negra. Sansão e Dalila. Nunca houve uma mulher como Gilda. Os melhores anos de nossas vidas. Belinda. O barco das ilusões. Amar foi minha ruína. Dois palermas em Oxford. Paraíso proibido. Tarzan e as amazonas. O império das ilusões. O Aranha-Negra no Planeta Mongo. Sansão, Gilda, Belinda e Dalila. Nunca houve uma mulher como Tarzan. Estou cansado. O chão da Glória tem gosto de sangue e sertão. Preciso dormir.

domingo, 25 de fevereiro de 2007

Entre o Oscar e Oscarito, prefiro o segundo. (Moacy Cirne)


BALAIO PORRETA 1986
nº 1959
Natal, 25 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos


Entre Oscarito e o Oscar, prefiro o primeiro. (Moacy Cirne)

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

Em se tratando de carnaval, nada melhor do que o frevo, o maracatu, a ciranda, a marchinha, o samba, o coco-de-roda. Eis aí o glorioso reinado momesco de Recife, que não nos deixa mentir. Ousamos dizer: de longe, ou de perto, o mais emocionante e criativo carnaval do Brasil.


BALAIO PORRETA 1986
nº 1958
Natal, 22 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos


UM SONHO DANADO DE BOM

Sonhei um sonho arrochado, beleza pura. Sonhei que, nesta última terça, às 22:10h, em viagem decidida de última hora, encontrava-me no Marco Zero, do Recife Velho, com minha companheira e uma de suas irmãs, no meio de entusiasmada multidão, ansiosa pelo excelente (e mais do que) centenário frevo. Sonhei com um show de Alceu Valença, arrebatador. Já passava de meia-noite, ou mesmo de uma da madrugada, quando, depois do espetáculo alceuvalenciano, os bonecos gigantes de Olinda "invadiram" o largo do Marco Zero. E o sonho continuava. Veio uma chuva fina, quando a Orquestra Multicultural de Pernambuco, regida pelo Maestro Spok, afinava os instrumentos. Depois, sem chuva, começava a apoteose da frevançafrevolente (mais do que centenária); uma Fantasia especialmente composta para a ocasião, "emoldurada" por embriagadora queima de fogos. E se a numerosa Orquestra Multicultural brilhava com intensidade, enquanto, ao lado, passistas mágicos encantavam a todos com seu bailado danado de bom, no palco figuras lendárias do frevo, e alguns de seus novos talentos, revezavam-se de forma emocionante com vários nomes consagrados da música brasileira: o próprio Alceu, já citado, Claudionor Germano, Lenine, Moraes Moreira, Leo Galdeman, Gal Costa, Antônio Nóbrega. Às 4:50h, debaixo de torrencial chuva - que voltara para saudar os foliões -, 60 mil pessoas, completamente realizadas, ao som de Vassourinhas, sem empurra-empurra e sem confusão, despediam-se do carnaval recifense de 2007. E o sonho parecia tão real, tão vivo, que acordei, algumas poucas horas depois, num hotel de Boa Viagem. Para, logo a seguir, voltar a Natal. Depois de passar pelo charmoso Paço Alfândega.


PIRANGI PIRANGI

A rigor, já na segunda, à noite, sonhávamos com o carnaval. Em Pirangi do Norte, ao sul de Natal. Acompanhando a Banda do Cajueiro, mandando brasa em frevos e marchinhas. E vendo passar, com alegria, o Bloco das Virgens (o nome mais apropriado seria Bloco das Virgens Enlouquecidas) e o Bloco Xibiu com Açúcar. Um carnaval bastante animado, pra falar a verdade.


ALGUNS FREVOS INESQUECÍVEIS

Vassourinhas (Matias da Rocha & Joana Batista, 1909)
É de amargar (Capiba, 1934)
Gostosão (Nelson Ferreira, 1950)
Frevo da meia-noite (Felinto Carnera, 1950)
Sonhei que estava em Pernambuco (Clóvis Mamede, 1950)
Último dia (Levino Ferreira, 1951)
Relembrando o Norte (Severino Araújo, 1952)
Vão me levando (Dosinho, 1955)
Evocação nº 1 (Nelson Ferreira, 1957)
Voltei, Recife (Luiz Bandeira, 1959)
Madeira que cupim não rói (Capiba, 1963)
Frevo e ciranda (Capiba, 1974)

Nota:
Esta é uma primeira e provisória seleção de grandes frevos.
Aceitamos sugestões para ampliá-la. O frevo, não esqueçamos,
é patrimônio cultural da humanidade. Convém lembrá-lo. Sempre.


sábado, 17 de fevereiro de 2007

VESTIBURRADAS

[] As glândulas salivares só trabalham quando a gente tem vontade de cuspir.
[] Os estuários e os deltas foram os primitivos habitantes da Mesopotâmia.
[] O ateísmo é uma religião anônima.
[] O petróleo apareceu há muitos séculos, numa época em que os peixes se afogavam dentro d´água.
[] Antes de ser criada a Justiça, todo mundo era injusto.

(Fonte: 500 anos de outras burradas)
[in Balaio 1283, 25/5/2000]


BALAIO PORRETA 1986

nº 1957
Natal, 17 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos



Repeteco do Balaio Vermelho
Quinta-feira, Janeiro 15, 2004

17 RAZÕES PARA SE GOSTAR MUITO DO BRASIL

1. A beleza da mulher brasileira.
2. As praias do Nordeste, São Paulo e Santa Catarina.
3. O Pantanal e a Chapada Diamantina.
4. Samba, choro, frevo e baião.
5. A música de Villa-Lobos, Pixinguinha, Luiz Gonzaga, Jacob do Bandolim e Tom Jobim.
6. A literatura de Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Machado de Assis e Clarice Lispector.
7. A poesia de Murilo Mendes, João Cabral, Manuel Bandeira
& o poema semiótico-espacional de Wlademir Dias Pino.
8. O cinema de Glauber Rocha e Nelson Pereira dos Santos.
9. A arte de Hélio Oiticica, Lygia Clark e Di Cavalcanti.
10. O humor gráfico de Henfil e J. Carlos.
11. O teatro de Nelson Rodrigues.
12. As cidades barrocas de um país tropical: Ouro Preto, Olinda e Paraty.
13. A culinária mineira & nordestina.
14. A cachaça mineira.
15. O Maraca (RJ) em clima de decisão.
16. Garrincha, Didi, Zizinho, Pelé e Nilton Santos.
17. Casa grande e senzala & Luiz da Câmara Cascudo.

[Acréscimos 2007: a música de Paulinho da Viola, Elomar, Sivuca,
Hermeto Pascoal, Tom Zé, Naná Vasconcelos & Lupiscínio Rodrigues;

o cinema de Eduardo Coutinho & Vladimir Carvalho;
os quadrinhos de Luiz Gê, Marcatti e Mutarelli;
o inverno no Seridó, no Rio Grande do Norte;
as praias do Rio de Janeiro;
a língua sertaneja.]

13 RAZÕES PARA NÃO SE GOSTAR DO BRASIL

1. A miséria e as diferenças sociais e econômicas.
2. A violência nas grandes cidades.
3. Os rios e lagos poluídos.
4. A "ideologia" da esperteza.
5. A "ideologia" da impunidade.
6. 90 ou 92% dos políticos.
7. Bundaxé music & similares.
8. Big Brother Brazil & similares.
9. A televisão aberta aos domingos.
[Possíveis exceções: os canais educativos e culturais.]
10. A americanização da língua.
11. Caras & a imprensa sensacionalista.
12. Um tal de Marcelo Rossi & as igrejas tele-evangélicas.
13. Os "cartolas" do futebol.


OS FILMES PORNÔS MAIS TESUDOS DO CINEMA
Seleção: Prof. Sérgio Villela [IACS/UFF, Niterói]

1. Amor e humor (Joey Silvera, 1985)
2. Atrás da porta verde (J. Mitchell, 1972)
3. Uma aventura sexual (Henri Pachard, 1983)
4. As aventuras de Buttman (J.S., 1990)
5. Bacanal em Malibu (Alex DeRenzi, 1991)
6. Bem no fundo de Vanessa (Alex DeRensi, 1985)
7. Carrossel erótico (Anthony Spinelli, 1984)
8. Dançando na sombra (John Stagliano, 1990)
9. O diabo na carne de Miss Joners I & II (Gregory Dark, 1972)
10. O diabo na carne de Miss Jones III (Gregory Dark, 1986)
11. O diabo na carne de Miss Jones IV (Gregory Dark, 1987)
12. Entre as bochechas (Gregory Dark, 1985)
13. Eróticos clássicos do passado (1914)
14. Os exercícios de Buttman (J.S., 1990)
15. Garganta profunda (Gerard Damiano, 1972)
16. O êxtase das garotas (Robert McCallum, 1980)

[in Balaio 514, 14/7/1993]

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Natal, Natal: o reencontro, a gente e o cheiro da terra, as figuras populares, a Capitania das Artes, o Sebo Vermelho, a Livraria da Cooperativa, as emoções de sempre. Uma boa notícia: chove no interior. Outra boa notícia: Cartas de Iwo Jima, de Clint Eastwood, entrou em cartaz no Cinemark do Medeimal. E o carnaval? Dizem que o de Caicó promete ser animadíssimo. O de Jardim do Seridó, também. Enquanto isso, algumas amigas preparam-se para ver o Galo da Madrugada, em Recife. Carnaval, Carnaval: é hora de brincar e ouvir Capiba, Nelson Ferreira, Lamartine Babo, o potiguar Dosinho. É hora de.


BALAIO PORRETA 1986
nº 1956
Natal, 16 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos


Repeteco do Balaio Vermelho

Sábado, 30 de abril, 2005


10 FOLHETOS DE CORDEL com títulos curiosos:

[] A menina que morreu em Caicó e depois de 20 horas enviveceu - falou contra o comunismo e o protestantismo,
de José Gomes da Silva
[] A mulher que o diabo surrou ou A espera da vingança,
de Hermes Gomes de Oliveira
[] A discussão da gripe asiática com o atum,
de Cuíca de Sto. Amaro
[] História em versos de um jegue que matou um homem, a porca comeu a criança e a mulher morreu de choque, no Município de Santana de Ipanema, Estado de Alagoas,
de José Honório Oliveira
[] História da menina, ou seja, o Padre Cícero Romão,
de Genário Vieira Barreto
[] A moça que mordeu o travesseiro pensando que fosse Vicente Celestino, de Cuíca de Sto. Amaro
[] O barbeiro que fez a barba do jegue, de Aristeu Guerra Moreira
[] Como Antonio Silvino fez o diabo chocar, de Leandro Gomes de Barros
[] História do burro que matou seu próprio dono de faca e o homem que matou a vaca e a vaca matou o homem com a mesma faca, de Moisés Matias de Moura
[] História do casamento do Tigre ou O cavalo do Mestre Coelho, de Luís da Costa Pinheiro

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Há blocos e blocos no Rio. Alguns, por sua alegria contagiante, merecem a minha/nossa simpatia (Gigantes da Lira e Imprensa Que Eu Gamo, em Laranjeiras; Suvaco de Cristo, no Jardim Botânico; Cordão do Bola Preta, na Cinelândia; Escravos da Mauá, na Zona Portuária). Outros, por seu apelo turístico, merecem a minha/nossa distância. Mas tudo é carnaval. E um bom carnaval não pode dispensar frevos e marchinhas. O resto é o resto: miolo-de-quartinha pra inglês ver.


BALAIO PORRETA 1986
n° 1955
Rio, 14 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br


A CAMINHO DE NATAL

Dentro de poucas horas estarei em Natal. Para mais uma temporada. Para mais um reencontro com as minhas raízes nordestinas. E seridoenses. Como sempre, não é possível garantir a regularidade das edições do Balaio. Uma, duas, três vezes por semana? De qualquer maneira, na dúvida, um bom carnaval para todos. Ao som de frevos e marchinhas.

Memória

BALAIO PORRETA
Natal, 25 de dezembro de 2005


Uma história real
UM BAR MUITO ESTRANHO

Hoje, 25 de dezembro, logo cedo, resolvi caminhar pelas ruas quase desertas do bairro de Lagoa Nova, aqui em Natal. Padarias fechadas, cigarreiras sem vida, nenhum movimento em muitos e muitos quarteirões. Mas eis que de repente, na esquina da São José com a Antônio Basílio, vejo um estabelecimento aberto. Animei-me. Entrei pela larga porta com cara de tentação. Um frízer oferecia-se ao primeiro freguês da manhã com suas cervejas gloriosamente geladas; não deixava de ser algo promissor. Ao lado, duas ou três prateleiras mostravam-se generosas com garrafas de cachaça, conhaque, vinho, uísque, o diabo. É verdade que a cachaça à venda não era das melhores, o conhaque parecia ser de quinta categoria, o uísque e o vinho talvez fossem falsificados. O ambiente também cheirava a algo diferente. Não importava. Aproximei-me da mocinha atrás do balcão:
-- Bom dia, minha prezada garçonete, gostaria de beber algo. Mas cadê as mesas? E as cadeiras? Adoraria beber sentado, com bastante calma.
A moça parecia espantada:
-- Não sou garçonete...
-- Não? Poderia chamar o garçom para me atender, então?
-- Aqui não trabalha nenhum garçom...
-- Puxa vida, que bar estranho: não tem garçom, nem garçonete, não tem mesas, nem cadeiras. E é muito grande para ser um buteco.
-- Mas...
-- Mas o quê, minha jovem, só falta você afirmar que este é um bar sem copos para servir o uísque, por exemplo. Como devo bebê-lo? Só quero uma dose, no capricho. E já que não tem garçonete, ou garçom, você pode prepará-la para mim?
-- Bem, na verdade... -- impacientou-se a jovem.
Um silêncio de rachar auroras nos dominou, por alguns segundos.
Prossegui:
-- Vejo agora, com mais atenção, que há prateleiras com remédios. É a primeira vez em minha vida que entro num bar com dezenas e dezenas de produtos farmacêuticos.
A mocinha apressou-se:
-- Meu senhor, isto aqui é um...
-- Ah, já sei, é um bar pós-moderno.
-- NÃO!
Do fundo do estabelecimento, apareceu um rapaz.
-- Viva, viva! Finalmente, o garçom! Eu sabia que tinha pelo menos um garçom!
-- Como assim?
-- Pois é, meu amigo, já deu para perceber que o bar aqui é estranhíssimo, mas por favor me consiga uma mesa e pelo menos uma cadeira para que eu possa beber meu uísque em paz. Será o meu café da manhã.
-- Como assim?
-- Que coisa... Assim não é possível, meu amigo, que droga de bar temos aqui? Onde já se viu? Estou decepcionado com vocês. Não o recomendarei a nenhum amigo, que bar mais sem graça. O próprio uísque à mostra não parece ser grande coisa. Que bar mais sem graça, repito. Aliás, acabo de ver que o seu nome também é bastante estranho: DROGARIA SANTA FÉ.


UM DISCO PORRETA
Mestres da MPB: Emilinha Borba
,
incluindo Escandalosa, Chiquita Bacana, Tomara que chova
[ Continental 995468-2 (cd 1994) ]

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Podemos avaliar o sentido histórico que possui uma época pela maneira com que essa época faz as traduções e procura assimilar os tempos passados e os livros antigos. (Friedrich NIETZSCHE. A gaia ciência. Trad. Márcio Pugliesi & outros. São Paulo: Hemus, 1981, p.97)

BALAIO PORRETA 1986
n° 1954
Rio, 13 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br


CONSIDERAÇÕES PENÚLTIMAS
Sei da tragédia. Sei da violência. Sei do horror, da morte, do medo, da perplexidade. Sei da dor, da incrível dor. Ao mesmo tempo, nada sei, nada sei. Não sei dos crepúsculos ensangüentados. Não sei das auroras angustiadas. Não sei das paixões furiosas. Mas sei da tragédia, da violência, do terror. Se não bastasse a degradação ambiental, provocada pelo próprio Homem, há a degradação individual, inserida no social, inserida na vida urbana mais e mais desumana. Nada é relativo. Nada é absoluto. Tudo é mais, tudo é menos. Talvez sim, talvez ficção. Deixemos a literatura de lado. Não, não deixemos a literatura de lado. Apesar de. Da miséria humana. Da miséria social. Da miséria pela miséria. Sei, sabemos. É verdade, é verdade. Há violências que extrapolam o sentido da existência humana. Exemplos não faltam. Infelizmente. Infelizmente. A violência do capitalismo global contra o Planeta Terra. A violência dos poderosos contra as nações periféricas. Ou a violência dos brutos contra crianças indefesas. Mas, apesar de tudo, nada justifica a pena de morte. Nada justifica o horror contra o horror.

POEMA DE
BOSCO SOBREIRA
(CE)
Noite Brasileira II
[ in Politicamente Incorreto ]

o medo germina
em cada esquina
em cada canto
e
fede

( o medo
é o de não ter
medo )

e
crianças
mulheres
homens
bichos
e
plantas
sonham pesadelos pelos quatro cantos do país


UM DISCO PORRETA
João
,
de João Gilberto
[ Philips 848 188-2 ]

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

O verdadeiro e o falso são atributos da linguagem, não das coisas. E onde não há linguagem, não há verdade ou falsidade. (HOBBES. Leviatã, in Dicionário filosófico de citações. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p.324)


BALAIO PORRETA 1986
nº 1953
Rio, 12 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos



ENIGMA

de Marize Castro (RN)

O que há de novo
entre minhas coxas
além de uma fenda
um atalhe
uma armadilha
para os mais desavisados?

[ in Marrons crepons marfins. Natal, 1984 ]


Repeteco
MÁXIMAS E MÍNIMAS DO BARÃO DE ITARARÉ

in Almanhaque para 1949

[] Os homens são de duas categorias: -- os solteiros e os loucos.
[] A ervilha é uma esmeralda com vitaminas.
[] A lágrima é o suor do coração.
[] Há mudos tão inteligentes que nem querem aprender a falar.
[] O bacalhau é um peixe lavado e passado a ferro.
[] Este mundo é redondo, mas está ficando muito chato.
[] Tempo é dinheiro. Paguemos, portanto, as nossas dívidas com o tempo.
[] A bicicleta é um cavalo, mas completamente diferente.
[] O fígado faz muito mal à bebida.
[] A estrela de Belém foi o primeiro anúncio luminoso.

UMA HISTORINHA DO BARÃO, NO ALMANHAQUE PARA 1949

No consultório de um psiquiatra houve o seguinte diálogo entre o médico e um novo cliente:
-- O que faz o senhor, com respeito à sua vida social?
-- Quase nada...
-- Não costuma passear acompanhado de uma ou outra garota?
-- Nunca.
-- Não sente ao menos um desejo de passear com garotas?
-- Bem... às vezes...
-- E por que não o faz?
-- Porque minha mulher não deixa!


Memória / Repeteco
O FESTIVAL DE BESTEIRA QUE ASSOLOU O PAÍS EM 1965
Texto de Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto)
[ in FEBEAPÁ - O Festival de Besteira que Assola o País, 1966)

"Segundo Tio Zulmira, 'o policial é sempre suspeito' e - por isto mesmo - a Polícia de Mato Grosso não é nem mais nem menos brilhante do que as outras polícias. Tanto assim que um delegado de lá terminou seu relatório sobre um crime político com estas palavras: A vítima foi encontrada às margens do Rio Sucuriu retalhada em 4 pedaços, com os membros separados do tronco, dentro de um saco de aniagem, amarrado e atado a uma pesada pedra. Ao que tudo indica, parece afastada a hipótese de suicídio" (p.15-16). De minha parte, quase 40 anos depois, continuo na maior dúvida: afinal, a vítima suicidou-se ou não?
__________________________________________________

UM DISCO PORRETA
Grands motets,
de Jean-Joseph Cassanéa de Mondonville (1711-1772),
por William Christie / Les Arts Florissants
[ Erato 0630-17791-2 (1997) ]


sábado, 10 de fevereiro de 2007

RECOMENDAMOS ESPECIALMENTE: Sassaricando... e o Rio inventou a marchinha, concepção, pesquisa e roteiro de Rosa Maria Araújo e Sérgio Cabral. Da peça (no Ginástico SESC, Centro do Rio) ao disco (Biscoito Fino BF 642, dois cds), admirável coletânea de músicas carnavalescas, com Eduardo Dussek e outros, incluindo a participação, sempre extraordinária, de Henrique Cazes (cavaquinhio e violão tenor), Silvério Pontes (trompete), Zé da Velha (trombone), Dirceu Leite (flauta, flautim. clarinete etc.), Beto Cazes (surdo, reco-reco, pandeiro, pandeirola), Luís Filipe de Lima (violão, violão de 7 cordas), Oscar Bolão (bateria), Nicolas Krassik (violino). E o repertório? Minha Nossa Senhora dos Mil Pecados! Vejam só: Maria Escandalosa, Aurora, Bandeira branca, Yes, nós temos banana, Pedreiro Waldemar, Maria Candelária, Jacarepaguá, Alá-lá-ô, Tomara que chova. Tem mais, muito mais: A lua é dos namorados, Pastorinhas, Daqui não saio, Tem nego bebo aí, Saca-rolha, Turma do funil, Touradas em Madri, Chiquita Bacana, Linda morena, Linda lourinha, O teu cabelo não nega, Pierrô apaixonado, Máscara negra, Pirata da perna-de-pau, Mamãe eu quero, Sassaricando, Cidade maravilhosa. E outras. E outras. Na verdade, em se tratando de carnaval, somente o frevo pernambucano, em termos de criação/animação rítmica e sonora, é capaz de superar a marchinha carioca. Aliás, exatamente ontem, 9 de fevereiro, o frevo completou 100 anos do primeiro registro jornalístico. Nestes 100 anos de história, é possível apontar Levino Ferreira (1890-1970), Capiba (1904-1997) e Nelson Ferreira (1902-1976) como seus maiores representantes. E Vassourinhas, composto em 1909, como seu verdadeiro hino.


BALAIO PORRETA 1986

nº 1952

Rio, 10 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos


A BIBLIOTECA DOS MEUS SONHOS
600 livros indispensáveis (5/100)

As pelejas de Ojuara, de Nei Leandro de Castro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, 296p. [Com dedicatória.] Carnavalização da cultura popular, trata-se do romance de maior sustança estética da literatura potiguar, um dos grandes títulos brasileiros dos últimos 30 anos. Entre o picaresco e a fábula, estamos diante de uma obra deliciosa: por seu tema (“a história verdadeira do homem que virou bicho”), por seu estilo, por sua brasilidade nordestina.

Carnaval, in Estrela da vida inteira, de Manuel Bandeira. Rio de Janeiro: José Olympio, 1966, p.47-76. [Adquirido na Universitária, em Natal, em 1966.] A poesia maior de Bandeira em textos quase sempre magistrais: Bacanal, A canção das lágrimas de Pierrot, Pierrot branco, Arlequinada, Pierrot místico, Rondó de Colombina, O descante de Arlequim, A dama branca, Rimancete, Madrigal, Alumbramento, Poema de uma quarta-feira de cinzas.

O livro de ouro do carnaval brasileiro, de Felipe Ferreira. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004, 422p. [] Uma boa introdução à história e à sociologia do nosso carnaval. Lamente-se, contudo, o pouco espaço dado ao frevo pernambucano, umas das resistências culturais mais fortes, hoje, à carnavalidade televisiva imposta pelo poder imperial da mídia. O melhor carnaval do país, nos últimos anos, caso já não tenha sido deturpado, é o do Recife Antigo.

História do carnaval carioca, de Eneida. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1958, 316p. [Adquirido no Brechó Desculpe, Mas Sou Chique, em Laranjeiras, Rio.] Em estilo claro e objetivo, um clássico da historiografia brasileira, considerando seus aspectos sociológicos e populares. Indispensável para quem pretende estudar as origens e o desenvolvimento do carnaval do Rio: os entrudos, o Zé Pereira, as Sociedades, os blocos, as músicas etc.

Ameno Resedá, o Rancho que foi Escola; Documentário do carnaval carioca, de Jota Efegê. Rio de Janeiro: Letras e Artes, 1965, 182p. [] O Ameno Resedá, o mais famoso rancho do carnaval do Rio, foi fundado no dia 17 de fevereiro de 1907, há 100 anos, portanto. Este livro, marcado pela emoção, narra a sua vitoriosa história, até ser “engolido” pelas escolas de samba, culminando com o seu fim no dia 15 de fevereiro de 1941.

Carnaval J. Carlos, de Luciano Trigo (texto) & Cássio Loredano (organização). Rio de Janeiro: Lacerda Editores, 1999, 190p. [] Excepcional coletânea de cartuns & capas de J. Carlos [1884-1950], o maior artista do humor gráfico brasileiro de todos os tempos, tendo como tema, aqui, o carnaval carioca em sua fase de ouro. A alegria das melindrosas, por exemplo, é contagiante. Assim como estonteante é o traço de J. Carlos.


UM FILME PORRETA
Carnaval Atlântida
(Brasil, 1952),
de José Carlos Burle,
com Oscarito, Grande Otelo, Cyll Farney, Eliana Macedo, Maria Antonieta Pons.
Exemplo perfeito da chanchada carnavalesca. Segundo o teórico e professor João Luiz Vieira, trata-se de um filme-manifesto, “uma experiência inédita no campo do cinema reflexivo, ou do metacinema” (História do cinema brasileiro, p.165).

UM DISCO PORRETA
Nove de Frevereiro
, de Antônio Nóbrega. [Brincante BR0007-2] Homenagem amorosamente criativa ao ritmo mais estonteante do carnaval brasileiro, através de alguns frevos famosos: Último dia (Levino Ferreira), Sonhei que estava em Pernambuco (Clóvis Mamede), A pisada é essa (Capiba), Dedé (Nelson Ferreira), Isquenta muié (Nelson Ferreira), Relembrando o passado (João Santiago). Com um ótimo encarte. Para ouvir e “frever”.


Almanaque do BALAIO

Evocação nº 1 (1957)

(Frevo-de-bloco de Nelson Ferreira)

Felinto... Pedro Salgado...
Guilherme... Fenelon...
Cadê teus Blocos famosos?
Bloco das Flores... Andaluzas...
Pirilampos... Após Fum...
Dos carnavais saudosos!
Na alta madrugada
O coro entoava
Do bloco a marcha-regresso
Que era o sucesso
Dos tempos ideais
Do velho Raul Moraes
Adeus, adeus, minha gente
Que já cantamos bastante...
E Recife adormecida
Ficava a sonhar
Ao som da triste melodia...


sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Na tradução deve ir-se até ao intraduzível: só então nos daremos conta da nação estrangeira e da língua estranha. (GOETHE. Máximas e reflexões. Lisboa: Guimarães editores, 1987, p.238)


BALAIO PORRETA 1986

n° 1951

Rio, 9 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br


POEMA DE
CARMEN VASCONCELOS
(RN)

Aprendizagens
"Não há nada de novo debaixo do sol"
(Eclesiastes, 1,9)

Chego ao sol, meu pasmo é imenso!
Quero enfeitiçar o amanhecer.

Tranço cabelos, destranco roupas,
fico tramando proximidades.

Guardo nesgas da noite nos poros,
trago cartas, cristais, oráculos
e pulsares varados de vidência.

Não me seguro em pensamentos,
o mundo é coisa de sentir.

Abro janelas em mim, e portas,
mas conservo cortinas, transparências,
para reter os avisos do vento.

Todos os dias teço aprendizagens,
todos os dias renasço de assombro.
O sol é um deus que sabe doar-se.

[ in Preá nº 12, Natal, FJA, 2005 ]


POEMA/PROCESSO PARA SER BEBIDO
(de Moacy Cirne)
Nas seguintes opções/versões:

1. Poema da goiaba escandalosa:

Uma vitamina de goiaba, batida durante 44 segundos, em liquidificador azulpotengíaco, com polpa de cupuaçu, sorvete de mangaba e um pouco de licor de menta. Deve-se bebê-lo em noite de lua cheia ao som de Carlos Zens. Ou de Naná Vasconcelos. Em outras palavras: a ave voa dentro do poema de Wlademir Dias Pino.

2. Poema do caju doidão:

Uma garrafa de cachaça de boa qualidade (Topázio, Seleta, Ferreira, Providência, Samanau), tendo-se como parede uma cesta de caju amigo. Convém bebê-lo numa tarde de sábado ao som de Jackson do Pandeiro. Ou de Luiz Gonzaga. Em outras palavras: nos alpendres d'Acauã pousa o sertão de Oswaldo Lamartine.

3. Poema do abacaxi prateado:

Um suco de abacaxi, batido durante 66 segundos, em liquidificador azulseridoense, com três morangos e bastante licor de laranja. Recomenda-se que seja bebido em horas cruvianas, ao som de Hermeto Paschoal. Ou de Tom Zé. Em outras palavras: os pássaros da madrugada recolhem a chuva alfa-silabária da poesia de Regina Pouchain.

4. Poema do sonho americano:

Coca-cola batida com pepsi, fanta laranja, cebola, pimentão, sal, açúcar refinado, um pouco de petróleo e banana com casca e tudo o mais. Para ser bebido exclusivamente por W.C. Bushit e seus amigos hollywoodianos, não importa a hora, não importa o lugar, não importa a cor do crepúsculo, ao som de fuzis neuróticos. Ou de metralhadoras esquizofrênicas. Em outras palavras: mais cedo ou mais tarde o império do mal americano explodirá numa tarde cinzenta de abril.

[ Projeto inaugural: julho de 2005 ]


UM DISCO PORRETA
Relendo Jacob do Bandolim,

de Joel Nascimento
[ RGE 6127 2 (1998) ]

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

NOVIDADES, NOVIDADES – Recomendações do BALAIO: 1. O deserto vermelho (1964), de Antonioni [dvd, Versátil]; 2. Alemanha, ano zero (1947), de Rossellini [dvd, Versátil]; 3. Revolução (2006), de Manara [quadrinhos, Conrad].


BALAIO PORRETA 1986

n° 1950

Rio, 8 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br


O MORTO
de NEWTON NAVARRO
[ in Subúrbio do silêncio. Natal, 1953 ]

Despido de azul e de paisagem
O morto está.
Silenciosa semente de carne
Aguardando as raízes.

Sem pai, sem mãe,
Sem casa,
Sem sono.
Até sem mortos
O morto está.

Não lhe resta lembrança alguma,
Ignora a tarde e as flores
Que o cobrem
E a escura casaca
Com que o vestiram um dia.

Não tem pranto nos olhos.
Não tem olhos,
Nem saudade,
Nem lembrança.

Nem ele mesmo se possui
Nem mesmo alma.

Apodrecida semente
Que espera raízes,
Assim o morto está:
Incompleto, inconseqüente
E só.

Sem presença
Sem confiança de que será terra,
Infinito,
Assim o morto está.

Os sinos da cidade
Não o despertarão nunca.
Por que, então, o vosso pranto, Senhora?

[ Extraído de Obra completa, I, 1998 ]


Memória
BALAIO INCOMUN 1460
Rio, 19 de dezembro de 2001
Tiragem acumulada: 268.350 cópias



DEFINIÇÕES ESPORRENTAS

[] Existencialismo é a doutrina filosófica que, na matemática euclidiana, assume que o Deus judaico-cristão-seridoense precede a essência geométrica dos fatores paralelos, esporrentos, convergentes e futebolísticos.

[] Niterói é uma cidade brasileira, ligeiramente azuladolescente, banhada ao norte pelo Oceano Índico e ao sul pelo Oceano Pacífico, na foz do Rio Amazonas, em Santa Catarina, ao lado da Baía de Todos os Santos e de Todos os Pecados, amém.

[] Jornal Nacional é um jornal radiofônico transmitido pela TV-Globo às terças, quintas e sábados, apresentado por Hebe Camargo, Ratinho e Ratão, completamente enlouquecidos, para satisfação do General da Banda, o marechal que se casou com Chiquita Bacana numa bela manhã de carnaval, sob os olhares espantados de Luiz Bonfá e Antônio Maria.

[] Travessia da Baía da Guanabara é uma travessia de caravela, entre a Serra da Mantiqueira e a Chapada Diamantina, no litoral de Pernambuco, e que se faz ao som de xaxados e xoxotes, de olho nas xoxotas do meu Brasil varonil.

[] Surrealismo é o movimento artístico e literário cantado em prosa e verso por Vicente Celestino e Chico Doido de Caicó, em noites milagreiras do Cai Pedaço, puteiro familiar às margens do Rio Seridó, no interior de Copacabana, o bairro mais famoso da capital paulista e adjacências.


UM DISCO PORRETA

Bird meets Diz,

de Charlie Parker & Dizzy Gillespie

[ Le Jazz CD 21 (grav. 1943-1952) ]

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Na verdade só sabemos quão pouco sabemos – com o saber cresce a dúvida. (GOETHE. Máximas e reflexões [1840]. Lisboa: Guimarães Editores, 1987, p. 79)



BALAIO PORRETA 1986

n° 1949

Rio, 7 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br



POEMA DE LUMA CARVALHO (RN)
[ in Tamborete. Currais Novos, RN, dezembro de 2003 ]


O pior (ou melhor, sei lá...)
De te amar...
É essa eterna e imensa
Saudade
Que sinto de você
Mesmo quando estamos abraçados...


TRÊS AMORES

Conto de Wescley J. Gama (RN)

[ in A Taberna ]

Leolina preparou preá naquela tarde túmida e quente, depois de acordar presunçosa e descabidamente linda, concordando com Erasmo no pensamento de que deviam deixar as barrancas do rio boi tatá e ganhar a direção das colunas de vento que levavam à cidade de Desvelo, onde seriam felizes para os dias que viessem. Mas o que houve deveras é que Erasmo pensara mais e não consentira em atinar na displicência de abandonar o chão que prometera ao seu famigerado pai cuidar. Leolina então preparou café e ficou triste por toda a tarde, se sentindo tão só como não merecia. Queria ganhar o mundo através das saídas pedregulhosas do sítio galinhas d'água. E foi com Irineu, mercante vendedor de bugigangas sertanejas, até os confins da idade tardia das estradas empoeiradas e quentes, até o dia em que Erasmo finalmente a achou e voltaram para casa no intuito de reatar o casamento no antigo ninho de suas venturas adolescentes. Contrariando suas próprias expectativas, Leolina foi feliz assim por muitos anos. Esperou Erasmo sair da cadeia pública e simples do município de Rio do Fogo, a muitos metros de distância do calor do fogo da lenha que ardia em Leolina, que chorava em pena por Irineu, que sofreu duas noites irresolutas como não sofrera nos fornos negros das cerâmicas em que trabalhara antes de ir viver do ofício de mercador nos idos das paragens sertanejas mais distantes dos olhos de sua esposa, Lorena, que viveu só à sua espera até o dia em que chegaram estórias de amor e sangue, de um lugar muito distante, chamado pelos povos indígenas de terra da dedicação. Desvelo, cercada de caiçaras e outras cercanias.




Humor / Futebol
ACONTECEU EM PARIS, COM O BOTAFOGO


A história a seguir, recontada por este Balaio, está no ótimo livro Os subterrâneos do futebol (Rio: Tempo Brasileiro, 1963), de João Saldanha, botafoguense histórico. Em maio de 1959, os alvinegros excursionavam pela Europa. Entre um jogo e outro, foram parar na capital da França. Pintou, então, uma folga. E folga, para aqueles jogadores (Amoroso, Amarildo, Garrincha, Tomé e os demais), só podia significar uma coisa: mulheres. Por obra e graça do destino, quando alguns deles cervejavam num dos bares da Cidade Luz, apareceram umas francesinhas que deixaram os marmanjos loucos. E eram jovens finíssimas, cada uma mais bonita, mais elegante e mais cheirosa do que a outra. Todos terminaram numa casa bastante distinta nas proximidades do bar. Só que havia uma senhora cinquentona, cinquentona e bonitona, dona do pedaço, que resolveu marcar um encontro para uma festinha íntima de confraternização no dia seguinte. Tudo acertado com a Madame “responsável” pelas jovens, eis que oito ou nove jogadores do Botafogo, assanhadíssimos, bem antes da hora combinada, já se encontravam na bela casa da Madame, que, além do mais, era poliglota. Acompanhava-os, meio por acaso, um jornalista esportivo francês, interessado numa entrevista com Mané Garrincha.

Passemos a palavra a João Saldanha:

“A madame dirigiu-se ao Amarildo: ‘Buenos dias amiguito. Veo que volvieran. Pero es temprano todavía. Hay que tener paciencia’ - falou com uma voz rouca e Tomé exclamou com cara de fauno: ‘Sou louco por mulher de voz grossa. Vai ser o fino’. E seguiu com o olhar o rebolado da madame que foi telefonar.

Nisto, o jornalista francês, meio embaraçado, perguntou ao Tomé:

- Mas vocês estão bem certos que é aqui o programa com as garotas? Eu bem que estava conhecendo isto. Sabem quem é esta madame? É o famoso travesti, Madame Arthur. É a dona de um cabaré de espetáculos. Aqui não tem mulher. Aqui é... é... bem, aqui é tudo homem, quer dizer... são travestis. É isto que vocês querem?!?!

Quando Madame Arthur voltou, a sala já estava vazia” (p.193-194).

Todos saíram correndo. Garrincha era o mais veloz de todos.

Não é preciso dizer que a gozação, na viagem para Madri, etapa seguinte da excursão, foi geral.



UM DISCO PORRETA

Luiz Gonzaga (ao vivo) volta pra curtir,

de Luiz Gonzaga

[ BMG/RCA 43218 55432 (grav. 1972) ]


terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Será que os cineastas não têm uma compreensão mais realista da política? Provavelmente. Mas atualmente, eles não se detêm em captar o conjunto de um fenômeno político, nem apreender a significação política do conjunto da sociedade. Eles se preocupam principalmente em interrogar as possibilidades de ação política que tem um homem de seu meio. A política então se reduz àquilo que este homem entende por política. O espectador ... não tem acesso direto ao fenômeno político; ele só tem acesso àquilo que uma consciência considera político. (Jean-Claude BERNADET /1968/. Trajetória crítica. São Paulo: Polis, 1978, p.121)



BALAIO PORRETA 1986

n° 1948

Rio, 6 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br



ZINGU!: MAIS UM NÚMERO NO ESPAÇO VIRTUAL

Editada por Matheus Trunk e Gabriel Carneiro, a revista Zingu! atinge a 5ª edição, cada vez mais provocadora, cada vez mais instigante, cada vez mais necessária. Neste número, o de fevereiro, há um Especial Carlos Motta e há um Dossiê Luiz Gonzaga dos Santos. E há, claro, o resgate da coluna crítica de Rubem Biáfora, um dos principais ídolos dos jovens cinéfilos que editam a Zingu! Mas também vale a pena ler os artigos de Gabriel Carneiro sobre As vinhas da ira (Ford), de Daniel Salomão Roque sobre Ranxerox (quadrinhos praticamente desconhecidos do grande público, e que são ótimos), de Andréa Ormund sobre À meia-noite levarei sua alma (José Mojica). Enfim, no mundo virtual, estamos diante de uma das principais publicações alternativas, no que diz respeito ao cinema & linguagens similares.


POEMA DE MAX MARTINS (PA)

O amor ardendo em mel

Morder
! morder o
hímem adocicado
-- frêmito de lâmina
entre duas coxas
do polo ao pólem.
E o apolo laminar morder
Morder os bicos dos figos
antes que murchos
antes dos dentes
sempre morder
e jamais sugar
da lua a sua ferrugem.
Morder somente a sua semente
antes de agora
antes da aurora
morder
e arder em mel
o amor.

[ in
Anti-retrato
/1960/,
republicado em Não para consolar /1992/ ]



Humor / Repeteco
DAS LEIS

Extraído do blogue Cinzas de Batalha [desativado]
de MARCELO BATALHA

Essa eu acabei de receber de uma amiga, e pode ser apenas um Hoax. Mas chegou como sendo uma história real e que ganhou o primeiro lugar no Criminal Lawyers Award Contest, e ao menos é 'divertida', da séria série Rir Para Não Chorar ou, se preferirem Só nos EUA Mesmo...

Um advogado de Charlotte, NC, comprou uma caixa de charutos muito raros e muito caros. Tão raros e caros que colocou-os no seguro, contra fogo, entre outras coisas.

Depois de um mês, tendo fumado todos eles e ainda sem ter terminado de pagar o seguro, o advogado entrou com um registro de sinistro contra a companhia de seguros.

Nesse registro, o advogado alegou que os charutos "haviam sido perdidos em uma série de pequenos incêndios". A companhia de seguros recusou-se a pagar, citando o motivo óbvio: que o homem havia consumido seus charutos da maneira usual.

O advogado processou a companhia... E GANHOU. Ao proferir a sentença, o juiz concordou com a companhia de seguros que a ação era frívola. Apesar disso, o juiz alegou que o advogado 'tinha posse de uma apólice da companhia na qual ela garantia que os charutos eram seguráveis e, também, que eles estavam segurados contra fogo, sem definir o que seria fogo aceitável ou inaceitável' e que, portanto, ela estava obrigada a pagar o seguro. Em vez de entrar no longo e custoso processo de apelação, a companhia aceitou a sentença e pagou US$ 15.000 ao advogado, pela perda de seus charutos raros nos incêndios.

Agora, a melhor parte...

Depois que o advogado embolsou o cheque, a companhia de seguros o denunciou, e fez com que ele fosse preso, por... 24 incêndios criminosos!

Usando seu próprio registro de sinistro e seu testemunho do caso anterior contra ele, o advogado foi condenado por incendiar intencionalmente propriedade segurada e foi sentenciado a 24 meses de prisão, além de uma multa de US$ 24.000.

Verdadeira ou não, e se fosse aqui no Brasil, como terminaria essa história?


UM DISCO PORRETA
Time out ,
de Dave Brubeck Quartet
[ Columbia CK 40585 (grav. 1959) ]

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Acredito firmemente que se todos os medicamentos, tais como agora são usados, fossem lançados ao mar, seria melhor para a humanidade – e desastroso para os peixes. (Oliver Wendell HOLMES, 1860, citado por Moacyr SCLIAR, in A paixão transformada; História da medicina na literatura. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p.161)


BALAIO PORRETA 1986

n° 1947

Rio, 5 de fevereiro de 2007

Poema/Processo, 40 anos

Contato: balaio86@oi.com.br

OS 10 MELHORES FILMES DE 'DISCOS VOADORES'

segundo DEMONARCH (SP)

[ in Stravaganza]

Seguindo a linha dos blogs de cinema em fazer 'listinhas' de 10 melhores (ou piores, dependendo do ponto de vista), aqui vai meu Top Ten dos dez melhores filmes protagonizados por 'discos voadores'. Não tão comum hoje em dia, eles pululavam pelas telas dos drive-ins nos 50´s e 60´s.


1) Earth vs. the Flying Saucers (Fred F. Sears, 1956).
Aliens malvados invadem Washington. Efeitos especiais surpreendentes (até hoje) de Ray Harryhausen.
2) The Day of Earth Stood Still (Robert Wise, 1951). Aliens bonzinhos invadem Washington. Sci-Fi com mensagem pacifista e momento memoráveis.
3) This Island Earth (Joseph M. Newman, 1955). Sci-Fi 'cheese' na qual casal de cientistas engata, a contragosto, projeto para salvação de mundo alienígena. O melhor disco voador que eu já vi.
4)
It Came From Outer Space (Jack Arnold, 1953). Alegoria xenofóbica da guerra fria, representando a paranóia e o medo do 'outro'.
5) The Man from Planet X (Edgar G. Ulmer, 1951). Um pequeno clássico do artesão Edgar Ulmer, tão belo quanto melancólico. Novamente o alien como 'estrangeiro' ou 'apátrida'.
6) Frankenstein meets the Space Monsters (Robert Gaffney, 1965). Problemas sérios envolvendo um Robô construído pela NASA com fito de afugentar alienígenas interessados em sequestrar mulheres terráqueas e leva-las para Marte. Seria uma fábula feminista?
7) Devil Girl from Mars (David McDonald, 1955). Aqui a história se inverte. Homens são raptados pela alienígena gostosa Nyah (Patrícia Laffan) que com um robô a tiracolo encarna o 'mal absoluto' dos B Movies: uma femme fatale do espaço sideral. Só vendo para crer.
8) Target Earth (Sherman A. Rose, 1954) - Não dá para acreditar!
9) Invasion of The Saucer Men (Edward L. Cahn, 1957). Little Sci-fi teenagexploitation! Drive in movie classics!
10) Plan Nine From Outer Space (Ed Wood Jr., 1959). Schlock clássico!
O último filme de Lugosi na pele (e capa) de uma zumbi revivido por alienígenas. Erros sequenciais, interpretações medíocres, temática absurda, disco voadores feitos de calota de carro (!); enfim, diversão garantida, sem a mínima postura crítica.


POESIA QUE TE QUERO POEMA
POEMA QUE TE QUERO POESIA

Poema de LARA DE LEMOS (RS)

Meus mortos estão guardados
em mim mesma.
Por isso não os procuro
em sepulturas.

Encontro-os
no labirinto dos sonhos
em longas noites
escuras.

[ Aos imigrantes,
in Dividendos no tempo. Porto Alegre, 1995)

AS MORTES
Poema de TANUSSI CARDOSO (RJ)

quando o primeiro amor morreu
eu disse: morri

quando o meu pai se foi
coração descontrolado
eu disse: morri

quando as irmãs mortas
a tia morta
eu disse: morri

depois, a avó do Norte
os amigos da sorte
os primos perdidos
o pequinês, o siamês
morri, morri

estou vivo
a poesia pulsa
a natureza explode
o amor me beija na boca
um Deus insiste que sim

sei não
acho que só vou
morrer
depois de mim

[ in Viagem em torno de. Rio, 2000 ]

Poema de FRANCISCO MARCELO CABRAL (MG)

Pedra

Escrevemos
porque sabemos
que vamos morrer.

Escrevemos
porque não sabemos
porquê.

[ in Livro dos poemas. Cataguases, 2003 ]

DOIS POEMAS de
ASCENSO FERREIRA (PE, 1895-1965)

Cinema

- Mas D. Nina,
aquilo que é o tal de cinema?

O homem saiu atrás da moça,
pega aqui, pega acolá,
pega aqui, pega acolá,
até que pegou-la.
Pegou-la e sustentou-la!
Danou-lhe beijo,
danou-lhe beijo,
danou-lhe beijo!...

Depois entraram pra dentro dum quarto!
Fez-se aquela escuridão
e só se via o lençol bulindo...

..........................................

- Me diga uma coisa, D. Nina:
isso presta pra moça ver?!...


Predestinação

- Entra pra dentro, Chiquinha!
Entra pra dentro, Chiquinha!
No caminho que você vai
você acaba prostituta!

E ela:
- Deus te ouça, minha mãe...
Deus te ouça...

[ in Xenhenhém, 1951, com Catimbó, 1927, e Cana caiana, 1939,
reunidos em Poemas, 1951 ]


UM DISCO PORRETA

Como tem Zé na Paraíba,

de Jackson do Pandeiro

[ PolyGram 558 361-2 (grav. 1962-81) ]

sábado, 3 de fevereiro de 2007

RECOMENDAMOS ESPECIALMENTE: Al-Fárabi (Rua do Rosário, 30) e Berinjela (Av. Rio Branco, 156), os dois sebos mais charmosos e mais completos – em termos qualitativos – do Centro, no Rio. Aliás, para quem ama os livros, o sebo – qualquer sebo – é um lugar especial, capaz de surpresas inesperadas. Até mesmo um simples sebo de rua tem suas magias. Esta semana, por exemplo, encontramos no sebo do ‘seu’ Miranda, na calçada da Laranjeiras com a Gen. Glicério, uma edição rara (lançada em 1961) de La peste, de Albert Camus, pela Gallimard. Além de um livro da Coleção Brasiliana, da Companhia Editora Nacional, editado em 1960, com autógrafo: O Marquês de Pombal e o Brasil, de Marcos Carneiro de Mendonça, famoso goleiro do Fluminense e da seleção brasileira nos anos 10 do século passado. Pois é, para quem gosta de livros, tendo consciência de sua importância social e cultural, sebos e livrarias são programas absolutamente necessários. Neste particular, aqui no Rio, Al-Fárabi, Berinjela, Luzes da Cidade, Imperial, São José, Folha Seca, Leonardo Da Vinci, Argumento, Prefácio, Livraria do Museu, Arteplex Livros, Timbre e as várias Travessas são templos sagrados, mais sagrados do que muitos “espaços religiosos” que se dizem cristãos. E de cristãos não têm nada, absolutamente nada.

BALAIO PORRETA 1986
nº 1946

Rio, 3 de fevereiro de 2007
Poema/Processo, 40 anos

Uma viagem sentimental pela
BIBLIOTECA DOS MEUS SONHOS
:
600 livros indispensáveis (4/100)

Cartas dos sertões do Seridó, de Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Lidador, 158p. [] Livro que já nasceu clássico, deliciosamente clássico, centrado nas histórias e vivências do Autor no sertanejamento de Acari, em pleno Seridó, através de cartas endereçadas ao jornalista Woden Madruga, da Tribuna do Norte, de Natal. Um livro tão gostoso quanto um café da manhã sertanejo, à base de canjica, cuscuz, pamonha, tapioca, queijo de coalho, leite, pão. E café.

Cantigas de escárnio e maldizer dos trovadores galego-portugueses, por Fernando Peixoto da Fonseca (org., pref., notas e glossário). Lisboa: Livraria Clássica, 1971, 141p. [] Uma ótima seleção da poesia medieval de origem ibérica. Inclui poemas & canções de Afonso X, Airas Nunes, João Baveca. E mais: João Vasques, Martin Soares, Pedro Amigo de Sevilha, Pero Mafaldo, Roi Pais de Ribeira, Vasco Peres Pardal. Sobretudo, um livro para pesquisadores.

Machado de Assis: Seus 30 melhores contos. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1961, 478p. [Livro adquirido em Natal, nos anos 60.] Seleção estabelecida a partir das opiniões de Afrânio Coutinho, Eugênio Gomes, Augusto Meyer, Sílio Romero, Lúcia Miguel Pereira e outros. Entre os contos, algumas obras-primas indiscutíveis: Missa do Galo, Uns braços, A cartomante, O alienista, Teoria do medalhão, Cantiga de esponsais, O espelho, A igreja do Diabo.

O Museu Darbot e outros mistérios, de Victor Giudice. Rio de Janeiro: Leviatã, 1994, 152p. [] O conto em sua expressão maior como burilamento da forma tensão/contensão conteudística. Basta que leiamos, basta que sintamos o “fraseado” lapidar de A única vez, A criação: efemérides, Cavalos, Jurisprudência, A história que meu pai não contou, Relatividade em nome de Borges, A festa de Natal da Condessa Gamiani, O hotel e O Museu Darbot.

Pensamentos, de Blaise Pascal. Trad. Sérgio Milliet. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1957, 294. [Livro adquirido em Natal, na Universitária, no início dos anos 60.] “A memória é necessária para todas as operações da razão” (p.138). “Aspiramos à verdade e só encontramos incertezas” (p.159). “A vida comum dos homens é semelhante à dos santos. Todos buscam sua satisfação e só divergem quanto ao objeto em que a colocam” (p.216).

Sandman: Noites sem fim, de Neil Gaiman & outros. São Paulo: Conrad, 2003, 162p. [] Verdadeiras preciosidades da arte gráfico-seqüencial quadrinhística, desenhadas/pintadas por Milo Manara (O que eu experimento do Desejo), Miguelanxo Prado (O coração de uma Estrela), Barron Storey (Quinze retratos de Desespero), Bill Sienkiewicz (Adentrando), Frank Quitel (Noites sem fim). E mais duas ou três histórias, todas deslumbrantes.


UM FILME PORRETA
Terra em transe (Brasil, 1967),
de Glauber Rocha,
com Jardel Filho, Paulo Autran, José Lewgoy, Paulo Gracindo.
Um dos grandes filmes políticos da história do cinema: explosão maior do talento glauberiano, ao lado de Deus e o diabo na terra do sol, trata-se de uma obra vigorosa, radical, politicamente estrutural (e não apenas conjuntural).

UM DISCO PORRETA
Nação Potiguar, de vários autores [ Scriptorin Candinha Bezerra/Fundação Hélio Galvão (1999) ]. Um hino ao Rio Grande do Norte, com a participação amorosa e criativa de Hermeto Paschoal, Carlos Zens, Xangai, Chico César, Antúlio Madureira, Gereba, Antônio Nóbrega, Quinteto Natal Metais e outros. Diante de Praieira (Othoniel Menezes & Eduardo Medeiros), ou de Royal cinema (Tonheca Dantas), por exemplo, somos alegria e tristeza, ao mesmo tempo.

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Almanaque do Balaio
Memória 1978
OS 10 CONTOS MAIS IMPORTANTES DA LITERATURA MUNDIAL
[ in Revista de Cultura Vozes, setembro de 1978 ]

Na opinião de Moacyr Scliar (RS):

1.Despertar (Babel)
2.O nariz (Gogol)
3.Colônia penal (Kafka)
4.Acender um fogo (London)
5.Missa do galo (Machado de Assis)
6.O ousado rapaz do trapézio suspenso (Saroyan)
7.O inimigo (Tchecov)
8.Objetos sólidos (Woolf)
9.Arábia (Joyce)
10.Bontzie, o silencioso (Peretz)

Na opinião de Murilo Rubião (MG):

1.O poço e o pêndulo (Poe)
2.
Os exilados de Poker Flat (Harte)
3.
Quatro encontros (James)
4.
Missa do Galo (Machado de Assis)
5.
Acender um fogo (London)
6.
Bola de sebo (Maupassant)
7.
A luz da outra casa (Pirandello)
8.
Os assassinos (Hemingway)
9.
O capote (Gogol)
10.
Uma rosa para Emily (Faulkner)