sexta-feira, 6 de março de 2009

Imagem:
RetroAtelier


BALAIO PORRETA 1986
n° 2589
Natal, 6 de março de 2009

Qual é o segredo da Bíblia, compêndio de narrações, mitos e histórias antigas, distantes de nosso mundo moderno e tecnológico, e, por sua vez, leitura singular que parece escrita "para nós", como se o texto fosse capaz de superar
o abismo do tempo?

(Juan ARIAS. A Bíblia e seus segredos, 2004)


O LIVRO DOS LIVROS
(12a)

Texto estabelecido por
Moatidatotatýne, o Escriba

Zé do Ouro, o Pobretão

Zé do Ouro era o filho predileto de Jacó Apenas Jacó e Raquel Apenas Raquel, a Tesuda. Além da preferência de seus pais, Zé do Ouro também despertava a inveja dos irmãos em função dos seus sonhos. Num deles, Zé do Ouro dançava xaxado com Marinês e sua gente. E Zé do Ouro se perguntava: "O que é xaxado? Alguma dança do carnaval baiano? Quem é Marinês? Alguma cantora de roque?" Em outro sonho, Zé do Ouro era o homem mais pobre do mundo e adorava comer cuscuz com ovo e carne-de-sol. E Zé do Ouro comentava: "Sei que sou paupérrimo, mas não sou o mais pobre entre os mais pobres. Além do mais, gosto mesmo é de cuscuz com leite e açúcar".

E Zé do Ouro passou a jogar no bicho, diariamente cercando o "assum preto" por todos os lados. E o jogo-do-bicho compreendia, segundo a Palavra sagrada: 1. acauã; 2. arribaçã; 3. assum preto; 4. boi calemba; 5. borboleta; 6. camaleão; 7. cascavel; 8. coelho; 9. curimatã; 10. ema; 11. formiga; 12. galo; 13. ganso; 14. gato do mato; 15. jararaca; 16. macaco-prego; 17. onça; 18. pavão misterioso; 19. peba; 20. preá; 21. raposa; 22. sagui; 23. tatu; 24. veado; 25. vaca.

Mas grande era a inveja dos irmãos. E Zé do Ouro era boa pinta e um cara estranho pra caralho. E o Senhor das Alturas, doido pra jogar merda no ventilador, já que chata era a eternidade, mexeu os pauzinhos celestiais para que ele, à revelia dos pais e com a aprovação dos irmãos, fosse vendido como escravo a mercadores da beira do Rio do Chico, que o revenderam a Putifar Putobar, chefe dos cangaceiros da Bahia formosa. E o Senhor das Alturas pensou: "Será que fui longe demais?"

E a mulher de Putifar Putobar, ao vê-lo por ele se apaixonou, e disse-lhe: "Dorme comigo e me fode todinha; farei com que você deixe de ser pobre". Mas ele recusou, dizendo à mulher: "Não posso trair o meu patrão, ele sempre me deu tudo, mas não permitirá que eu a conheça intimamente, por debaixo dos lençois bordados em Caicó. Como eu poderia fazer tamanha maldade pecando contra o Senhor das Alturas?" A mulher insistiu: "Dorme comigo e te darei todas as mulheres dos meus amigos. O Senhor das Alturas não reclamará, tenho certeza". E Zé do Ouro mais uma vez recusou-se a satisfazer seus desejos. E ela insistiu. E insistiu. E insistiu.

E Zé do Ouro não mais resistiu. E foi uma noite com cheiro de mel, melão e melancia. E foi uma noite carregada de auroras enlouquecidas. E foi uma noite marcada por gemidos e soluços embriagadores. Mas Putifar Putobar descobriu a traição e jogou Zé do Ouro na prisão e a mulher num convento de freiras. E Zé do Ouro foi torturado. E torturado foi Zé do Ouro, tendo como principais algozes o papa Bento 16 e o arcebispo de Olinda e Recife, José Cardoso Sobrinho assim chamado, dois notórios agentes das forças demoníacas do Além, sob a supervisão de João Rabo de Foguete Incastesca Agacialesco, e os aplausos da Folha Escrota de S.Paulo. Afinal, para os editores da FESP, tudo não passava de uma "ditabranda".

Certo dia, quando o alvorecer já se fora, o chefe de Putifar Putobar, por nome Farofeiro Faraó, acordou achando que era um enorme inseto e que se chamava Gregor Grego Gregório. E o poderoso Chefão, mais doidão do que nunca, mandou chamar todos os catimbozeiros de Salvador e reuniu o conselheiro Franzesko Kafta e todos os pais-de-santo para contar-lhes de seu aperreio. Mas nenhum deles pode aliviá-lo da sua agonia. Nem mesmo o Senhor das Alturas atendera a seus apelos desesperados. Então se lembraram do estranho Zé do Ouro que preso se encontrava.

Próximo capítulo:
Continuação de
Zé do Ouro, o Pobretão

6 comentários:

dade amorim disse...

Essa é a tradução da Bíblia mais nordestina que se pode imaginar. Esse Zé está maravilhoso.
Beijo, Moacy.

Unknown disse...

Muito BOM!!!! Vá aproveitando, porque depois do caso do Bispo excomungar até os vizinhos de quem deixou a criança abortar, não sobrará um cristão sobre a face da terra. Até eu interferi publicando num jornalse o Bispo era a favor da Pedofilia e do incesto, porque não excomungar o tal do Bispo?

Aguardarei o próximo capítulo.
Mas esse jogo do bicho daí tem esses nomes mesmo?

Grande abraço

Mirze

Jens disse...

Putaquiupariu, Moacy: até o velho Franz na Bíblia do sertão? Pirou de vez.
E o Putifar Putobar, hein? Eita corno de maus bofes!
Um abraço igualmente ensandecido.

Adrianna Coelho disse...


Moa,

esse capítulo é um dos melhores!
eu ri muito com o jogo do bicho, segundo a palavra sagrada...
a Folha Escrota de S. Paulo, a FESP e sua "ditabranda", Gregor Grego Gregório e Franzesko Kafta... ahahahahaa

Vc consegue mesmo surpreender! tá muito bom!! :)

beijos

Adrianna Coelho disse...


ah, e essa foto do retroatelier tá linda, hein.

Marcelo Novaes disse...

Moacy,

Episódio triste essa venda pra mulher chantajosa e birrenta. Senti a falta do tiziu cantando seu lamento lamentoso no jogo do bicho [sobretudo quando trancafiado na gaiola de Noé Noel, Papai de Nóis Thudhu; Patrono da Ecologia do Céu...]. Relato bom, ainda que calamitoso e mais cheio & pleno de lacunas do que as amigas das muuié do PutoBar, mais a dita cuja.







Abraços,






Marcelo.