sexta-feira, 16 de janeiro de 2009


Nu reclinado (1917):
Amadeo Modigliani
[1884-1920]


BALAIO PORRETA 1986
n° 2538
Rio, 16 de janeiro de 2009

Suas melhores páginas nos esmagam. Ele punha
em versos difíceis uma prosa magnifíca.

(Maurice BARRÈS, sobre Baudelaire,
in Passagens, de Walter Benjamin)


POEMA de
CHICO DOIDO DE CAICÓ

Incrível Fantástico Extraordinário
Já champrei caicoenses e espanholas
Natalenses, mineiras e cearenses
Gaúchas, argelinas e até uma americana
Mas nunca champrei uma pernambucana


INSTRUÇÕES E CONSELHOS PARA A JOVEM NOIVA
Sra. Ruth Smythers
[ Esposa do reverendo L. D. Smythers,
pastor da Igreja Metodista Arcadiana da Congregação Leste,
de Nova York ]

Trad. Walter Cardoso Franco

Texto impresso e distribuído em 1894,
parcialmente divulgado pelo Balaio, nº 232, de 8/8/1990,
a partir de sua publicação na revista gaúcha Dundum

Nota:
Por ser um um texto relativamente longo
para os padrões do Balaio,

resolvemos destacar em vermelho
as partes que nos parecem mais interessantes.


Para a jovem e sensível moça que alcançou o privilégio de crescer e chegar ao casamento, devemos dizer que este dia é, ironicamente, o mais feliz e também o mais aterrorizante de sua vida. Do lado positivo, há o casamento propriamente dito, no qual a noiva é o centro das atenções de uma cerimônia bonita e comovente, cerimônia esta que simboliza o seu triunfo em lhe assegurar um homem que lhe proverá todas as suas necessidades pelo resto de sua vida natural. Do lado negativo, está a noite de núpcias, durante a qual a noiva deve “pagar para ver”, vulgarmente falando, ao se defrontar, pela primeira vez, com a terrível experiência do sexo.

Nesse ponto, cara leitora, deixe-me revelar uma verdade chocante. Algumas jovens, na realidade, aguardam a noite de núpcias com um misto de curiosidade e prazer! Cuidado com tal atitude! Um marido egoísta e sensual pode facilmente tirar vantagem de tal noiva. Nunca se esqueça de uma regra capital, para qualquer casamento: dê pouco, raramente, e sempre de má vontade: do contrário, o que tem tudo para ser um casamento feliz pode transformar-se numa orgia dos sentidos.

Por outro lado, o temor da noiva não deve ser extremo, porquanto o sexo, que, na melhor das hipóteses, é algo bastante doloroso, deve ser cultivado, e o tem sido pela mulher desde o início dos tempos, e é recompensado pela união monogâmica e pelos filhos. A maioria dos homens, se não lhes for negado, desejam fazer sexo quase todos os dias. A noiva sábia deverá permitir um máximo de duas rápidas relações sexuais por semana durante os primeiros meses do casamento. À medida que o tempo passar, ela deve envidar esforços para reduzir tal frequência. Doenças simuladas, insônia e dores de cabeça são os melhores aliados de uma esposa quanto a isso.

A maioria dos homens são por natureza pervertidos, e se a eles for concedida a menor chance, prontamente passarão a solicitar uma ampla variedade de práticas sexuais das mais repugnantes. Tais práticas incluem realizar o ato normal em posições aberrantes, praticar sexo oral no corpo da mulher, oferecendo os seus próprios e obscenos corpos para também serem usados com a boca da mulher.

Argumentos, apoquentações, repreensões e questionamentos também são muito eficazes, se usados tarde da noite, cerca de uma hora antes de o marido normalmente começar sua sedução.

As esposas inteligentes devem estar sempre alerta e cientes de novas e melhores maneiras de negar e desencorajar as aproximações amorosas de seus maridos. Uma boa esposa deve reduzir as relações sexuais ao mínimo. O ideal é uma só por semana ao fim do primeiro ano de casamento e uma por mês ao fim do quinto ano.

Ao redor do décimo ano de casamento, muitas mulheres já completaram a sua prole e atingiram o objetivo final de terminar todo e qualquer contato com seus maridos. Nessa época, ela deve fazer do seu amor pelos filhos e das pressões sociais elementos eficazes que mantenham o marido em casa.

Como já mencionamos anteriormente, a mulher, além de se manter alerta quanto a ter o mínimo de relações sexuais possíveis, deve também prestar muito atenção em limitar a espécie e a qualidade das relações sexuais. (..)

A mulher inteligente terá por objetivo nunca deixar que o marido a veja despida, nem que este se apresente despido. Praticar sexo, quando este não puder ser evitado, só em total escuridão. Muitas mulheres acham muito útil usar uma pesada e grossa camisola de algodão e providenciar pijamas para o marido, e não tirá-lo durante o ato sexual. Assim, um mínimo de corpo ficará exposto.

Uma vez que a noiva tenha colocado a sua camisola e apagado todas as luzes, ela deve deitar-se quieta e placidamente ao longo da cama e esperar pelo noivo. Não deve fazer qualquer ruído que possa, na escuridão, orientá-lo em sua direção; caso contrário, ele poderá interpretar isso como um sinal de encorajamento. Ela deve deixá-lo andar às apalpadelas no escuro. Existe sempre a esperança de que ele venha a tropeçar e sofrer alguma lesão, que, por mais leve que seja, possa vir a ser usada como desculpa para negar qualquer contato sexual. Quando ele a encontrar, ela deve permanecer tão imóvel quanto possível. Qualquer movimento de sua parte pode ser interpretado como excitação sexual. Se ele tentar beijá-la nos lábios, ela deve virar ligeiramente a cabeça de modo que o beijo alcance inocentemente as suas bochechas. Se ele tentar beijar-lhe as mãos, ela deve mantê-las com os punhos fechados. Se ele levantar a sua camisola e tentar beijá-la em qualquer outra parte do corpo, ela deve, imediatamente, puxar para baixo a sua camisola, pular da cama e anunciar que a mãe natureza a chama ao banheiro. Isso, geralmente, amortecerá o desejo dele de beijá-la em territórios proibidos.

Se o marido tentar seduzi-la com conversas lascivas, a esposa inteligente repentinamente lembrar-se-á de perguntar-lhe alguma coisa trivial e não sexual. Uma vez obtida a resposta ela deve prosseguir a conversação, não importando quão frívola ela possa parecer na ocasião. (...)

Ela deverá permanecer absolutamente calada ou falar sobre seus afazeres domésticos, enquanto ele realiza as manobras que o ato sexual requer. Sobretudo, ela nunca deverá emitir grunhidos ou gemidos durante a realização do ato sexual. Tão logo o marido complete o ato sexual, a mulher inteligente deverá começar a aborrecê-lo com conversas sobre tarefas que ela quer que ele realize no dia seguinte.

Muitos homens obtêm a maior parte de sua satisfação após a pacífica exaustão que se segue ao ato. Sendo assim, a mulher inteligente deve assegurar-se de que ele não tenha paz nesse período, pois, do contrário, ele logo se achará tentado a querer um pouco mais. A mulher inteligente deve se apegar ferrenhamente para que, sem descanso, atinja o seu principal objetivo de primeiro limitar e mais tarde anular completamente o desejo sexual dos seus maridos.

Nota1:
Para ver o texto no original (em inglês), na íntegra, clique aqui.
Nota2:
Quando de sua publicação no Balaio, o texto da Sra. Smythers - uma peça de humor involuntário - recebeu o título de Crônica da moral escrota. Não, não estávamos antecipando a escrotidão atual da revista Veja e daqueles que, na própria Abril, fizeram a horrorosa telecinagem de Quanto mais quente melhor. Nem tampouco estávamos prevendo a ridícula seleção do melhor da música erudita feita pela revista Bravo!, outra merdice atualmente patrocinada pela mesma Abril.

8 comentários:

Mariana Botelho disse...

risos no café da manhã! rsrsrs
ótimo balaio, Moacy!

Anônimo disse...

moacy:
o texto orientador das casadas remete
à raínha vitoria:
"abra as pernas e pense no reino".
fórmula encantadora,essa.estimulante.
um abraço.
romério

Unknown disse...

Moacy:

Os conselhos de Dona Smythers contêm um viés de humor involuntário e outro de horror explícito: a negação do gozo. O falo bem temperado lhe parecia doloroso por falta de relaxamento, de retribuição ao carinho proporcionado pelo pau que a comia, de aceitação da festa a dois.
Por outro lado, embora eu não tenha pesquisado historicamente o assunto, duvido que as destinatárias daqueles conselhos tenham aderido em bloco a seus termos: mesmo entre as mais moralistas e religiosas, com certeza, muitas desfrutaram (e continuam a desfrutar) do prazer de trepar pois nenhuma passagem da Bíblia diz que pau e xota foram invenções do demônio - pelo contrário, Adão foi criado (com pau) à imagem e semelhança de Deus, que, logicamente, também tem pau.
E aquelas moralistas e religiosas viviam num mundo onde outras mulheres (ciganas, prostitutas, negras, índias etc.) circulavam, atentas à delícia de serem o que são: seres humanos desejadas e desejantes.
Em tempo: penso que a mulher que trepa com vontade não é apenas comida, também é comedora de seu parceiro, delicioso banquete entre amantes.
Abraços:

Marcos Silva

Theo G. Alves disse...

rapaz, mande logo uma compilação dos poemas mais escrotos (no melhor dos sentidos) de Chico Doido pra essa senhora. O marido dela e suas seguidoras deverão agradecer.

Muadiê Maria disse...

É tragicômico.

Unknown disse...

Amigos:

Acho que o melhor remédio para Dona Smythers seria aquele que apareceu em "Tenda dos milagres" (o seriado: li o romance há muito tempo, também quase esqueci do filme de Nelson Pereira dos Santos). O personagem principal, acossado por uma pomba-gira, a conselho de sua mãe de santo, enfia-lhe uma poção especial na xota e a pomba-gira goza! E sem ficar com raiva por ter gozado!
Abraços:

Marcos Silva

Fábio François Fonseca disse...

Coitado deste reverendo, viveu o inferno na Terra...

Unknown disse...

Recado para François:

Mas Deus pode ter ajudado o reverendo a gozar legal com outras mulheres ou com homens... Seria uma evidência a mais de Sua grandeza.
Abraços:

Marcos