quinta-feira, 11 de junho de 2009

Memória gráfica do séc. XX:
a luta contra o fascismo franquista
na Guerra Civil Espanhola.
Cartaz de
Bardasano
[ via Homo Luddens ]


BALAIO PORRETA 1986
n° 2689
Rio, 11 de junho de 2009

Difícil dizer qual das duas incomoda mais:
a inteligência ostensiva ou a burrice extravasante.
(Stanislaw Ponte Preta. Máximas de Tia Zulmira)


PEDRAS-DE-TOQUE
de
MÁRIO FAUSTINO
1930-1962
[ in O homem e sua hora, 1955 ]

Nem uma só verdade resplandesce
Neste verão sonhado por abutres.
( in Noturno )

Os cães do sono ladram
Mas dorme a caravana de meu ser
( in Mito )

Os cães do sono calam
E cai da caravana um corpo alado
( in Mito )

Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora
( in Sinto que o mês presente me assssina )

Que vale o lenço impuro da elegia
Sobre teu rosto, lúcida alegria?
( in Onde paira a canção recomeçada )

Esse estoque de amor que acumulei
Ninguém veio comprar a preço justo.
( in Soneto antigo )


ACHADOS E PERDIDOS
Renata Nassif
[ in Fênix em Verso e Prosa ]

E se eu me perder e me deixar naufragar? E se eu me deixar dissolver na correnteza?

Mas, se me perco no deserto — se não tenho mar!, só o ar quente e parado, que estala nos ouvidos, me entala na garganta o suspiro.

Mas, se me perco e é só o mormaço do dia estéril.


AMOR SOLITÁRIO
Marisete Zanon
[ in Estranhos e Anormais ]

Meu amor é um sonho impossível
é água que não molha
remédio que não cura
alegria sem riso.
É um cão sem osso
um poeta sem musa
par de chinelo sem dono
um blog sem visita.
É um nu sem dorso
um pacote sem adorno
time sem torcida.
É amor sem esperança
bailarina sem dança
menina sem fita.
É amor sem desdém.
Meu amor é um anjo
que nunca diz amém!


MÁXIMA DE TIA ZULMIRA
Stanislaw Ponte Preta

Pobre daquele que não guardou
consigo um pouco da infância.


SUBSTANTIVO PLURAL

O ótimo Substantivo Plural, de Tácito Costa (Natal, RN), está de cara nova: visualmente mais limpo, mais ágil, mais atraente. Decerto continuará um espaço aberto para a literatura, o cinema, a poesia, a informação, a polêmica.


POLÍCIA: FORA DA USP!
Flávio Aguiar
[ in Carta Maior ]

Assisti chocado às cenas de barbárie provocadas pela presença da Polícia Militar no campus da USP. Li os relatos de meus colegas que estavam presentes a uma Assembléia da Adusp, no prédio da História e Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Muitos desses colegas tentaram mediar a situação, e também foram agredidos com bombas de “efeito moral” – leia-se gás lacrimogênio e gás pimenta – além de outras agressões. Vi as cenas, por linques da internete, da PM invadindo o campus universitário com carros, tropas, motos, helicópteros, uma verdadeira “blietzkrieg” contra estudantes, funcionários, professores, contra a autonomia universitária, contra a universidade pública e crítica, cuja sobrevivência é vital para a inteligência do país.

As cenas têm antecedentes: lembram a invasão do prédio da Faculdade de Filosofia, na Rua Maria Antonia, no centro de São Paulo, em 1968. Além de tantas outras invasões e agressões contra a universidade, pelo país a fora, durante a ditadura e também antes e depois.

Em 1968 foram a polícia e o CCC (Comando de Caça aos Comunistas), sediados na Universidade Mackenzie, em frente, que promoveram a agressão, resultando no saque e na depredação do prédio da Faculdade, além de – mais grave ainda – na morte de um estudante, baleado por um dos membros daquela organização fascista.

Agora, fica a perplexidade: não há mais CCC, e dentro das regras constitucionais, a ação da polícia dentro do campus só é permitida de respaldada por um pedido da reitoria, salvo em casos como assalto, incêndio ou outras catástrofes, o que, evidentemente, não é o caso.

A reitoria chamou a polícia, alegando necessidade de garantir acesso aos prédios, diante de piquetes de funcionários em greve. Tomada essa medida completamente inoportuna e equivocada, as conseqüências são imprevisíveis. Como dirigente da Adusp que fui, tive de interferir em situações análogas no passado (que me parecia remoto, mas se fez presente de súbito, de novo). Invariavelmente essas situações entravam numa escalada sem fim, até a instalação da pancadaria como “forma de diálogo”, se me permitem a ironia. “Pancadaria” em termos, porque é claro que se tratava mais de um espancamento, uma vez que a desproporção entre as partes não deixa dúvidas. Daí, ao invés das palavras, rolam cassetetes, balas de borracha e as tais bombas “de efeito moral”, e a fumaceira dos disparos das balas e bombas impregna o ar com sua cortina de vandalismo onde deveria prevalecer o diálogo.

As cenas, vistas na internete (imagino para quem estava lá), são revoltantes, e tanto a presença da polícia como a atitude de quem a chamou, merecem repúdio completo. Dirigir uma universidade – qualquer universidade – não é coisa para principiantes. Há uma história por detrás disso tudo, e quem se abaliza para essa direção tem obrigação de conhece-la e obrigações para com essa história. Polícia no campus ou contra manifestações de estudantes só deu baderna e agressão contra a universidade, essa é a regra desde sempre – acho que desde a fundação das primeiras universidades na Europa, no século XIII, quando já havia conflitos entre estudantes e autoridades em nome da autonomia universitária (as primeiras foram em Bolonha e em Paris). Na América Latina sempre foi assim, e no Brasil assim aconteceu desde as históricas lutas pela abolição da escravatura e pela república. É famoso o episódio da pancadaria em Recife entre a guarda policial e os estudantes que reivindicavam a abolição e a república em setembro de 1866, o que levou o então jovem Castro Alves a declamar, da sacada de um jornal, de improviso, seu poema “O povo ao poder”, com os célebres versos: “A praça, a praça é do povo/como o céu é do condor”.

O tempo passou e o condor hoje é uma ave ameaçada de extinção a que cabe proteger. A liberdade, essa é uma ave sempre ameaçada de extinção, em qualquer canto do globo onde o autoritarismo obtuso e rombudo, mas também pontiagudo como a baioneta em riste, contra ela invista, ou onde a autoridade por detrás delas se esconda.

A universidade é para estudantes, funcionários e professores. A polícia nada tem o que fazer lá, a não ser agravar os conflitos e substituir as negociações que devem mediar os conflitos. A universidade tem que dar o exemplo nisso. É esse o seu papel formador, e não o de se curvar à tradição das armas e do autoritarismo que tanto marcaram a vida brasileira. À polícia, portanto, só resta a retirada. À autoridade que a chamou, ou que consentiu em sua presença, só resta voltar atrás e reabrir as negociações. Se alguma razão tivesse em se mostrar reticente quanto a negociar – agora a perdeu completamente, e por suas ações ou omissões.

O que cabe agora é a responsabilidade histórica de, por sobre as razões particulares, chamar à voz da razão, que manda negociar e parlamentar. Aos professores, funcionários e estudantes, da USP, solidariedade total, essa deve ser a consigna dos democratas que lutaram e lutam pela liberdade de expressão neste nosso país de violências inesgotáveis.


12 comentários:

Unknown disse...

Bom dia, Moacy!

Receio que de pequenos em pequenos atos solitários que sequer notamos, tenhos um novo "ismo", como na imagem da guera civil espanhola.

Ai que saudades das máximas do Stanislaw, do Pasquim....

Mário Faustino deu um show de exuberância!

Todos os poemas muito bons, mas fico com o de Marisete Zanon.
Além de poema a verdade dentro dele.

Uma pena o que houve ontem na Usp!
Espero que esse tipo de violência seja contida a tempo!

Belo Balaio!

Beijos

Mirse

Francisco Sobreira disse...

Moacy,
Lendo o artigo de Flávio Aguiar, de repente me vi transportado para as trevas da ditadura militar. Por que ainda acontecem fatos como esse? Ainda bem que temos Mário Faustino, que você oportunamente faz relembrar. Um abraço.

Anônimo disse...

Moacy!!! Que maravilha isso!!!! Estou muito feliz de ver aqui o meu poema. Acredite, meus olhos derramaram lágrimas...um super obrigada pelo espaço.Vou fazer propaganda nos meus blogs, esse acontecimento é histórico pra mim!!!
um grande abraço

Marisete Zanon

Unknown disse...

Moacy:

Obrigado por divulgar o texto de Flávio Aguiar sobre os horrores atuais na USP. Agradeço tb a Mirse e Sobreira pela solidariedade. O desrespeito a uma instituição acadêmica é uma ameaça para toda a sociedade.
Abraços:

Marcos Silva

Marcelo F. Carvalho disse...

Belíssima entrevista lá no Palimpnóia!

Walquíria disse...

Passando pra conferir o poema de Marisete. Muito bom!
Triste esse problema na USP. Muita coisa tem que mudar nesse país.
um abraço
Wal

Beti Timm disse...

Mestre querido,

É lamentável, que no Brasil ainda ocorram fatos como os que ocorrerram na Usp, de longe só posso ser solidária,o que as vezes é pouco.

Há uma dúvida cruel entre a intelig~encia ostenciva ou a burrice extravassante. Mas acredito que a intelig~encia ostenciva é bem mais difícil de aceitar, um inteligente arrogante, perde o charme que deveria ter.

Adorei "Amor solitário" da Marisete, perfeito ao comparar com um blog sem visita. Deve ser desesperador...rs

Beijos

Laura_Diz disse...

O livro é bom, Cirne, de verdade.
Lamentável estes fatos na USP, triste.
Que desencontro este seu com os lançamentos... queria te conhecer aqui.
Um abraço, Elianne-Laura

Cosmunicando disse...

o texto de Flávio Aguiar não deixa margem de dúvida... é incrível como a história se repete, apesar dos pesares. Daí também a perfeita adequação do cartaz de Bardasano.

Adorei as pedras-de-toque do Faustino e a máxima do Stanislaw =)

Maravilhoso poema da Marisete!

beijo Moa

SOLDADONOFRONT disse...

MUITO BOM.

!!@V@NTE MOA!!

líria porto disse...

estou com a usp!!! e não abro pra polícia!!!!!!!!!!

BAR DO BARDO disse...

textos sempre bons...

uma antologia...

parabéns a todos!