segunda-feira, 20 de agosto de 2007


E que se faça um belo rio.
E que, em se fazendo o rio,
faça-se a maravilha em forma de delta:
o Delta do Rio Parnaíba, no Piauí.


BALAIO PORRETA 1986
nº 2097
Rio, 20 de agosto de 2007


LEGENDA
de Mário Faustino (PI)
[ in
O homem e sua hora, 1955 ]

No princípio
Houve treva bastante para o espírito
Mover-se livremente à flor do sol
Oculto em pleno dia.
No princípio
Houve silêncio até para escutar-se
O germinar atroz de uma desgraça
Maquinada no horror do meio-dia.
E havia, no princípio,
Tão vegetal quietude, tão severa
Que se entendia a queda de uma lágrima
Das frondes dos heróis de cada dia.

Havia então mais sombra em nossa via.
Menos fragor na farsa da agonia,
Mais êxtase no mito da alegria.

Agora o bandoleiro brada e atira
Jorros de luz na fuga de meu dia -

E mudo sou para cantar-te, amigo,
O reino, a lenda, a glória desse dia.


DOIS POEMAS
de Mário Coivara (CE)
[ in Faca de Fogo ]

trago a lembrança dos teus pés transportando a rotina do mel.

[][][]

é noite. a insônia me argumenta.


Memória 1924
DECÁLOGO DA ESPOSA
[ in Revista Feminina, SP, out./1924 ]

I - Ama teu esposo acima de tudo na terra e ama o teu próximo da melhor forma que puderes; mas lembra-te de que a tua casa é de teu esposo e não do teu próximo;
II - Trata teu esposo como um precioso amigo; como a um hóspede de grande consideração e nunca como uma amiga a quem te contam as pequenas contrariedades da vida;
III - Espera teu esposo com teu lar sempre em ordem e o semblante risonho; mas não te aflijas excessivamente se alguma vez ele não reparar nisso;
IV - Não lhe peças o supérfluo para o teu lar; pede-lhe, caso possas, uma casa alegre e um pouco de espaço tranqüilo para as crianças;
V - Que teus filhos sejam sempre bem arranjados e limpos; que ele ao vê-los assim possa sorrir satisfeito e que essa satisfação o faça sorrir quando se lembre dos seus, em estando ausente;
VI - Lembra-te sempre que te casaste para partilhar com teu esposo as alegrias e as tristezas da existência. Quando todos o abandonarem fica tu a seu lado e diz-lhe: Aqui me tens! Sou sempre a mesma;
VII - Se teu esposo possuir a ventura de ter sua mãe viva, seja boa para com ela pensando em todas as noites de aflição que terá passado para protegê-lo na infância, formando o coração que um dia havia de ser teu;
VIII - Não peças à vida o que ela nunca deu para ninguém. Pensa antes que se fores útil poderás ser feliz;
IX - Quando as mágoas chegarem não te acovardes: luta! Luta e espera na certeza de que os dias de sol voltarão;
X - Se teu esposo se afastar de ti, espera-o. Se tarda em voltar, espera-o; ainda mesmo que te abandone, espera-o. Porque tu não és somente a sua esposa; és ainda a honra do seu nome. E quando um dia ele voltar, há de abençoar-te.
[ Republicado em: História da vida privada no Brasil/3, p.394-6)

Nota do Balaio:
Publicada em São Paulo, na ocasião com cerca de 600 mil habitantes, a Revista Feminina é um valioso documento histórico para se entender a prática e o pensamento masculinos que, durante décadas e décadas, nortearam a relação homem/mulher entre nós. É verdade que as mulheres, embora timidamente (para os padrões atuais), já começavam a reagir. Resta-nos saber se o Decálogo em pauta foi levado a sério pela leitoras das grandes cidades. Não temos dados sobre a sua tiragem e se, de fato, atingia o público feminino de forma expressiva.

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Que se procure fazer sempre o novo, o válido e que se considere a poesia como uma insubstituível forma de cultura, da qual depende, em boa parte, a vitalidade da língua, portanto do pensamento, portanto da nação. (Mário FAUSTINO /1957/, in Pref. Benedito Nunes. Poesia de Mário Faustino. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1966, p.34-5)

10 comentários:

Anônimo disse...

Início de semana inspirador com as belezas do Piauí e de Mario Coivara.
Bom dia pra ti. Beijo.

Anônimo disse...

Salve o Piauí! Tão injustiçado no triste comentário daquele presidente da Philips. Salve Moacy!

Anônimo disse...

Excelentes os poemas de hoje, meu caro Moacy.
Boa semana!

Fernanda Passos disse...

bem, enquanto ia lendo o texto da revista sentia uma inquietação a tomar tomar de mim. Rsrsrsrs.
Vale como documento histórico, mas como manual de vida a dois....sei não.

E o Delta do Parnaíba é realmente de tirar o fôlego. Muitas e muitas vezes já passei por essas paragens.

Bjs.

Anônimo disse...

Passeando com você conheço a imensidão desse Brasil...
Os poemas, lindos.
beijos

o refúgio disse...

Hiii, Moacy, se for por esse Decálogo acho não fui tão boa esposa não. Mas pintou uma dúvida: no primeiro parágrafo, o próximo a que se refere o texto pode ser o amante da esposa? Sacanagem (risos).

Beijos.

Anônimo disse...

Caro Moacy,
Muito oportuno relembrar Mário Faustino, que me parece anda esquecido. Um abraço.

dade amorim disse...

Gostei dos poemas, Moacy. E quanto ao decálogo... bom, é pra você ver como os tempos mudam... Beijo.

Anônimo disse...

caríssimo moacyr. grande é meu contentamento por estar na ribanceira do teu caderno. gradecido, viu

Sonia Sant'Anna disse...

DECÁLOGO DA ESPOSA
Nessas horas dou graças por estarmos no século XXI. E ainda tem mulher com saudades dos tais "bons tempos".