quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008


Copacabana,
via
Ana de Toledo


BALAIO PORRETA 1986
n° 2238
Rio, 20 de fevereiro de 2008



SEDE
Ana Lima
[ in Menina Gauche ]

Uma ninfa e um marujo
habitam em mim.

Sinto fome
de algo
que não tem nome.

Tenho sede
de coisas inexistentes
que vivem nas pontas dos meus dedos
palpitantes
e suados

como alguém em derradeira agonia.


Memória 1969
A CENSURA NA ÉPOCA DA DITADURA MILITAR / 4
[ in Memória da Censura no Cinema Brasileiro ]

Parecer literal
sobre o filme A mulher de todos, de Rogério Sganzerla

Trata-se de película típica de festivais, em que o seleto público recebe um roteiro pormenorizado sobre as intenções do autor, diretor, etc.
Como diz o autor (fls.12 do processo), o filme é "uma aventura pornográfica, em homenagem às fitas alemãs ou suecas - classe "B"; é outro pejorativo cujo estilo obsceno serve para melhor retratar NOSSA REALIDADE - não por moralismo mas por ideologia".
Realmente, o autor satiriza tudo e, em algumas cenas o PAULISTA, mostrando-o como um bossal homem das cavernas; cita uma ilha dos PRAZERES, que poderia ser a do GUARUJÁ, e seus frequentadores.
Toda a película, enfim, tem um cunho satírico, atravéz de símbolos imaginados pelo autor.
Quanto aos cortes, com base no relatório dos censores WILSON QUEIROZ e JOSÉ AUGUSTO COSTA e em minha observação, são os seguintes:
1ª PARTE - cortar a cena em que aparece um jornal exibindo o título "DELFIM NETO DIZ QUE 69 SERÁ O ANO DE OURO".
- cortar a cena em que a mulher aparece dansando, c/ os seios nús.
- cortar a cena em que a mulher aparece mordendo o pescoço de seu amante (foi deixada a cena imediatamente anterior, menos chocante, que é o início da que indicamos para corte).
2ª PARTE - cortar a cena em que a mulher é filmada no barco com os seios nús.
- cortar a cena das nudistas, em que as mesmas são filmadas óra apresentando só os seios nús, óra apresentando o púbis nú.
- trilha sonora: retirar as palavras "peitudas" e "bundudas".
- cortar as cenas em que aparece uma seringa hipodérmica e em que o jovem casal toma injeções de entorpecente.
- trilha sonora: retirar a frase "não existe liberdade individual sem liberdade coletiva".
3ª PARTE - cortar a cena em que a jovem agarra, sôfregamente, o homosexual pelas costas.
4ª PARTE - cortar a cena em que a jovem é filmada de cócoras dando a impressão de estar urinando.
- cortar a cena em que a mulher tira a blusa, exibindo os seios nús (da cena toda deixar apenas 12 fotogramas).
5ª PARTE - deixar apenas 24 fotogramas da cena total em que aparece um jovem cortando o pulso.
Brasília, 6 de de outubro de 1969
- G. Montebello -

Comentário do Balaio:
De todos os pareceres que lemos até o momento, este é um dos mais terríveis, por revelar, sem meias palavras, o clima de sufoco da época em questão, incluindo observações que seriam hilárias se não fossem trágicas.. E, sem maiores surpresas, através de ridículos erros gramaticais, por apresentar o preparo intelectual (nulo, ou quase) dos censores e ditadores de plantão. Em tempo: 12 fotogramas equivalem a meio segundo de projeção.


RECOMENDAMOS
a leitura de Diário de férias - 3 (sobre o filme Sangue negro)
[ in Sopão do Tião ].

5 comentários:

Anônimo disse...

Ah! Que bacana!
Obrigada e o meu carinho especial

Anônimo disse...

Um abraço grato, Moacir!

Foto linda, linda da Ana.

Beijos!

Ada Lima

Vais disse...

Ei Moacy,
adorei o Sede.
parabéns Moacy por não deixar que a memória se perca nos chópins e na banalização da história.
Não consegui ver ainda o Sangue, não rolou no 'velho' aqui, vou ver... vou ver...
beijo

Jens disse...

Moacy:
o censor tinha sérios problemas com os seios nús. E também com a gramática (bossal, dansando). Deprimente, em todos os aspectos.

Ane Brasil disse...

Táquepariu, eu já tinha ouvido falar que a turma da tesoura era semia"narfa".... pô, mas acho que era mais que semi.... era "anarfa" total.
sorte e saúde pra todos - menos pra turma da tesoura.